domingo, 4 de dezembro de 2016

Resumo de História do Direito Brasileiro para AV2

História do Direito Brasileiro

RESUMO DE HISTÓRIA DO DIREITO PARA A PROVA DE AV2
(Por Serggio Silva)


CAPÍTULO I
COM QUANTAS NAUS SE FAZ UM PAÍS?


A chegada dos portugueses
Administração Colonial - Capitanias hereditárias
Capitanias hereditárias
A criação do governo-geral
A escravidão e a economia colonial
A agromanufatura açucareira
Mineração - A Era do Ouro
(ENVOLVE AS QUESTÕES 1 E 6)

O Reino de Portugal nasceu das armas! Com isso, queremos dizer que, no século XII, Portugal lutava para expandir seu território rumo ao sul, ocu­pando territórios sob domínio mouro (muçulmanos) e, ao mesmo tempo, preocupado com a ameaça representada por Castela que via no Condado Portucalense, o núcleo inicial do reino de Portugal, “um vassalo rebelde a ser submetido pela força”. Vejamos na gravura a seguir:

Por que navegar foi tão importante para os portugueses? Muitas vezes somos levados a um raciocínio enganoso. Portugal é um país pe­queno para os nossos padrões, no entanto, realizou façanha em escala nunca vista organizada pelo reino que, simultaneamente, estimulava o comércio marítimo e a reconquista das terras ocu­padas pelos mouros e ia se afirmando politicamente em torno da monarquia.
Para o fortalecimento do seu poder, os reis contaram com um corpo de funcionários leais ao Esta­do, corpo esse no qual assumem destaque os legistas subsidiando o po­der dos governantes, principalmente após a Revolução de Avis de 1385 que, expulsando do país elementos favoráveis ao domínio de Castela, beneficiou a burguesia concentrando recursos tecnológicos e militares, fornecendo o suporte ao empreendimento das navegações reunindo in­teresses de cunho político, econômico, religioso e militar em um plano sem precedente na História.
A ascensão do Mestre de Avis como D. João I ao trono português im­primiu pulso à economia de Portugal. Segundo o numeramento, embora com população pouco superior a um milhão de habitantes, em sua maioria vivendo no meio rural, a dinâmica da vida econômica portugue­sa era orientada por um Estado que atendia aos interesses mercantis, ao mesmo tempo em que pretendia satisfazer a nobreza guerreira.
Portugal foi beneficiado pela unificação já em 1249, mais de dois sé­culos antes da espanhola. Ao navegar pelo Atlântico, os portugueses superaram antigos mitos, abrindo perspectivas de intercâmbio numa escala planetária, o que demandou esforços de organização por parte do Estado português, conciliando interesses da nobreza guerreira e dos grandes comerciantes, o que se comprova com a conquista de Ceuta em 1415, entreposto comercial no norte da África, aonde che­gavam ouro, seda e marfim. Para a burguesia, esse empreendimento alimentava a perspectiva de grandes lucros no comércio a partir da costa africana, na qual se estabeleceram muitas feitorias.
Muito poderosos eram os interesses da nobreza, reunindo o desejo de glória militar contra o infiel muçulmano, a cobiça por terras e, tam­bém, pela oportunidade de expandir o cristianismo.
O Estado centralizado tornava-se peça essencial à expansão maríti­ma, pois era capaz de mobilizar recursos em uma escala nacional, finan­ciando projetos e reunindo segmentos sociais com diferentes visões de mundo. Os governos centralizados se caracterizavam basicamente pela organização de uma justiça real aliada à disponibilidade de um tesouro real, bem como a existência de um exército real para garantir a presença do Estado e o acatamento as suas decisões.
Devemos lembrar que o povo português forneceria o elemento hu­mano de uma expansão pelo mundo. O fato da América Portuguesa, que, mais tarde virá a ser o Brasil, constituir o mais importante projeto colonial lusitano não nos permite desconhecer a presença portuguesa nos quatro cantos do planeta, cobrindo do Atlântico Norte ao Japão na segunda metade do século XVI.
Lisboa, nesse período, havia se tornado uma cidade cosmopolita reunindo gente de variadas origens como genoveses, catalães, mouros, florentinos, aragoneses enfim, enorme variedade de etnias e de idiomas, típicos de uma cidade rica, encruzilhada de civilizações, afinal tratava-se de gente, com as ambições de enriquecimento que, em todas as épocas, constituíram poderoso atrativo para superar os medos.
Outro aspecto a ser lembrado é o do conhecimento científico, par­ticularmente o conhecimento cartográfico. O século XV, ao ampliar as possibilidades de contato entre as civilizações, tornou necessário o registro e a representação das novas terras e povos que alteraram para sempre a visão que os homens tinham de seu planeta e dos seus habi­tantes.
O conhecimento científico sofria sérias limitações, e isso dava força a toda uma série de crendices associando temores às travessias oceânicas. Evidentemente combater crendices não eliminava os perigos reais de tempestades e dificuldades de abastecimento que cria­vam barreiras às expedições de longa distância.
Na proporção que as viagens progrediam, o conhecimento adquirido levava a questio­namentos e à incorporação de informações em função das descobertas, a exemplo das regi­ões africanas atingidas pelos portugueses, ampliando as perspectivas de lucro.
Fator importante a ser considerado foi o desenvolvimento da ciência náutica e a inven­ção de novo tipo de embarcação, a Caravela.
O feito do navegador genovês fez com que os reis de Portugal e Espanha disputassem as terras recém-descobertas. Uma primei­ra solução foi estabelecida pela Bula Papal Inter Coetera (1493), que determinou o limite de cem léguas a oeste de Cabo Verde ― limite recusado por Portugal.
Esse impasse foi resolvido apenas com a mediação do Papa Alexan­dre VI, mediante a assinatura do Tratado de Tordesilhas (1494), pelo qual as terras situadas a 370 léguas a oeste das ilhas de Cabo Verde integrariam os domínios da Espanha, ao passo que aquelas situadas a leste pertenceriam ao reino de Portugal.

Portugal recorreu ao poder da Igreja, pois os Papas até o século XVII agiram como árbitros supremos nas questões internacionais. Só com base nos escritos de Hugo Grotius (1562-1645) teremos outros referen­ciais para disputas diplomáticas, em uma época em que os Estados irão afirmar sua soberania sem reconhecer uma autoridade supranacional. Essa situação se consolida com a Paz de Westfalia.
Algumas questões devem ser levantadas. Em primeiro lugar, para que o mundo fosse efetivamente dividido em duas esferas de poder era preciso que do outro lado do planeta, a 180°, houvesse outra linha de­marcatória, funcionando como contrameridiano. Os portugueses se mantiveram no propósito de atingir as Índias, dirigindo-se para o Oriente, o que permitiu o estabelecimento de numerosas feitorias na costa africana.
Portugal vivia o reinado de D. Manuel (1495-1521). Os monarcas anteriores haviam equilibrado as atenções do Estado na aventura marítima com a tradição das práticas da agricultura. O novo monarca dispendeu seus esforços essencialmente em atingir os centros de comércio de todo o mundo. A seu favor contava a experiência portuguesa na navegação, que, em 1488, ultrapassou o cabo das Tormentas no sul da África, abrin­do o caminho para o oceano Índico e para as terras das especiarias. A navegação ganhava outro patamar, saindo no ocidente de uma perspec­tiva local, condicionada pelo Mediterrâneo, para uma escala planetária, onde o domínio das rotas comerciais teria peso decisivo.
Vasco da Gama deu a Portugal grande vantagem em relação aos mer­cadores venezianos. A partir da descoberta do caminho marítimo do comércio indiano artigos como pimenta, cravo, gengibre e noz mosca­da estavam ao alcance dos europeus.
Mesmo tendo perdido dois navios carregados de especiarias o inves­timento na frota de Vasco da Gama foi altamente recompensado com um lucro em torno de 6 mil porcento (Huberman, 1981, p. 98).
Em 1500, a expedição de Cabral atinge o litoral do que hoje é o estado da Bahia.

ATENÇÃO!!!

O tratado de Tordesilhas, assinado entre Portugal e Espanha, foi ignorado pelos outros reinos como a França, que rapidamente enviou seus barcos para o novo mundo, desconsiderando a divisão acordada pelos países ibéricos. Por duas vezes houve tentativa francesa de estabe­lecer colônias na parcela portuguesa da América.
A expedição enviada à Guanabara resultou na fundação da colônia da França Antár­tica, somente erradicada com a expulsão dos franceses em 1567 e a permanência portuguesa na região, com a fundação da cidade do Rio de Janeiro.
Durante três anos, os franceses se mantiveram no Maranhão, fundando São Luís, a úni­ca capital brasileira que não foi estabelecida pelos lusitanos, nomeada assim em homena­gem ao rei da França, defensor do cristianismo à época das Cruzadas.
Na área que coube aos espanhóis, estes se preocuparam em manter o controle das regiões mineradoras, notadamente os vice-reinos de Peru e México, este chamado de Nova Espanha, cedendo espaço ao avanço de ingleses e franceses em regiões da América do Norte. Igualmente na América do Sul, vastos territórios na Amazônia compreendidos no domínio dos espanhóis acabariam integrando a América portuguesa, alterando muito o estabelecido em Tordesilhas.
Alguns pontos de convergência devem ser estabelecidos entre as colonizações ibéricas na América.
Ocorreu, porém, uma pro­funda diferença no desenrolar dos diversos processos de colo­nização.
A Espanha, desde o princípio de exploração das terras do novo continente, foi bem-sucedida na sua busca por ouro e prata. Contrastando com os portugueses que encontraram índios em um estágio primitivo, desconhe­cendo referenciais básicos para a civilização trazida da Europa, a exemplo das cidades, os espa­nhóis entraram em contato com civilizações avançadas.
Valendo-se de circunstâncias favoráveis, como as dissidências que minavam o império aste­ca na América Central, assim como o domínio do império inca na América do Sul, os espanhóis estabeleceram as bases de um sistema militar-mineiro, em que um punhado de aventureiros, como Cortez e Pizarro, entre outros, submeteram numerosas populações indígenas.
A ambição desses homens, atendendo ao serviço da coroa, levou a morte de milhões de indígenas, quer pela violência dos conquistadores, quer pelas doenças por eles trazidas.
A chegada de metais preciosos deu momentaneamente a condição de grande potência aos monarcas espanhóis, governantes de um reino alicerça­do na união de Aragão e Caste­la, esta última impulsionadora da expansão marítima. Colom­bo, sem ser exceção entre os grandes aventureiros, era um homem em que conviviam os desejos de riqueza, fama e gló­ria e aspirações à descoberta de possíveis paraísos terrestres.
Cabral chegou às terras americanas buscando riquezas e reafirmando a presença portuguesa como havia sido acertado em Tordesilhas.
Pedro Álvares Cabral é sempre citado entre nós como o descobridor das terras que hoje formam o Brasil e, no entanto, raramente se mencio­na que sua expedição iniciada em março de 1500, no porto do rio Tejo, em Lisboa, somente se completou em julho de 1501, ao retornar das ín­dias com seis dos treze navios originais, ainda assim se revelando em­preendimento muito lucrativo.
Pois é, lembram-se da famosa carta de Pero Vaz de Caminha, em que ele contou as proezas e aventuras vividas pela expedição chefiada por Cabral? Esse é comprovadamente o primeiro caso de nepotismo em nos­sa terra, pois além detalhar o descobrimento para Sua Majestade, apro­veita para pedir favores para seu genro.
Apesar de Cabral ter tomado posse das terras que cabiam a Portugal, não houve interesse maior em investir nas terras recém-descobertas, uma vez que o Oriente apresentava muitos atrativos para o comércio.
As expedições que sucederam ao descobrimento mantiveram o obje­tivo de explorar as terras à procura de riqueza de fácil obtenção.
Foram mandadas expedições ao litoral, tendo como principal resul­tado a constatação da existência do pau-brasil, madeira útil para a ativi­dade têxtil.
A oferta no litoral de árvores do pau-brasil era grande, o que favo­receu a exploração predatória. Além dos portugueses, os navegadores franceses se tornaram frequentadores do nossa costa, a ponto dos na­tivos saberem distinguir os Mair, franceses, dos Perós, portugueses. O escambo, prática comum na relação entre europeus e nativos, era enten­dido como uma troca pelos indígenas, porém, numa perspectiva mais ampla, era parte de uma circulação mercantil europeia, importante acu­muladora de riquezas.
O papel da monarquia portuguesa guiando o processo de expansão marítima administrando interesses diversos como o da burguesia e o da nobreza. A divisão do mundo em Tordesilhas e o período denominado pré-colonial.
Administração Colonial – Capitanias Hereditárias
Você deixaria terras recém-descobertas sem o controle e proteção jurídi­ca de alguém de confiança? Parece que não. Portugal resolveu esse dile­ma por meio de um arranjo administrativo.
Capitanias hereditárias
No início do século XVI, os portugueses estavam voltados para o comér­cio com o oriente e se limitaram ao reconhecimento das regiões litorâ­neas em suas terras americanas, travando conhecimento com as tribos e, por meio de escambo, obtiveram a colaboração dos nativos para a ex­ploração da fonte de riqueza mais evidente, a extração em grande quan­tidade de pau-brasil, madeira empregada para tingir tecidos na Europa.
Portugal não podia deixar ao acaso seus domínios enquanto outros países começavam a empreender suas viagens e reprimir a presença de embarcações francesas tornou-se tarefa primordial. Além disso, manter o controle dessa costa imensa era muito caro.
Somente em 1530 a expedição de Martim Afonso de Souza ao Brasil materializa a colonização, reprimindo a presença de barcos estrangei­ros levando pau-brasil, criando núcleos de povoamento e deixando na região do Rio da Prata os marcos de soberania de Portugal.
A fundação de São Vicente trouxe para o Brasil a estrutura citadina re­presentada pelas casas, capela, cadeia e pelourinho, bem como a nomea­ção de autoridades como juízes, meirinhos e escrivães. Portugal precisava de mais do que isso para tornar a colônia rentável e controlada por Lisboa.
No nascedouro das cidades eram erguidos os pelourinhos, colunas de pedra localizadas em áreas centrais onde se castigavam os infratores, como símbolo da autoridade do Estado português.
Os limites estabelecidos em Tordesilhas levam a alguns pequenos problemas, mais destacados ao se examinar a divisão do Brasil em capi­tanias hereditárias, solução encaminhada pelo governo português para a ocupação do território sem comprometer o tesouro real, um processo, portanto, vinculado à iniciativa privada.
Por falar em Tordesilhas você deve se perguntar como aquelas pes­soas sabiam exatamente em que lugar passava a linha de Tordesilhas. A resposta é: não sabiam!
O conhecimento geográfico tinha muitas limitações e a precisão dei­xava muito a desejar.
O rei português procedeu à divisão do território brasileiro em 15 lotes de terras confiados a 12 donatários que ali exerceriam autori­dade por sua delegação. Foram investidos de direitos sem, contudo, poderem vender os territórios recebidos. Os referidos direitos com­preendiam fundar vilas, cobrar impostos e dominar tribos rebeldes ao controle português, entre as quais sobressaiam os tupinambás, nume­rosos e que percebendo os conflitos entre os europeus se aliaram aos franceses contra os lusitanos.
A ideia era que os donatários, burocratas e militares, alguns deles experimentados nas lutas das Índias, pudessem manter a conquista e assegurar a integridade e o povoamento do território. A maioria, contu­do, não conseguiu arcar com as despesas para se instalar nas suas capi­tanias, que, de resto, não podiam simplesmente ser vendidas.
Na prática, apenas cinco donatários efetivamente tomaram posse das suas capitanias.
Dom João III mandou vir da metrópole mudas de cana-de-açúcar. O que não estava pre­visto foram dificuldades para dominar os índios, mesmo ten­do o apoio de pessoas aqui che­gadas como náufragos, degredados ou não, fazendo a intermediação entre os colonizadores e os nativos.
Os colonizadores eram pouco numerosos e, em vários casos, se adaptavam às línguas e costumes da população nativa. Havia uma lín­gua geral, o tupi, mais falado que o português.
Assim entendemos a importância de homens como João Ramalho e Caramuru.
“Assim, quando se pretendia falar ao povo, era a língua selvagem que mais se empregava, reservando o português, língua oficial, para as camadas mais cultas.” (Azevedo, 1943. p. 179).
Os donatários se reservavam direitos da cobrança de impostos sobre tudo o que fosse produzido na capitania, podiam fundar vilas, bem como doar lotes de terra, chamados ses­marias ― para alguns a origem remota de latifúndios em nosso país. Em resumo, espera­vam facilidades a serem oferecidas pelo governo para obter lucro.
Dois documentos estabeleciam deveres e direitos dos donatários:
1- A Carta de Doação, pelo qual o soberano concedia as terras aos capitães-mores, com direito de juro e herdade;
2 - O foral, fixando os direitos, foros e tributos respectivamente ao Rei e ao capitão-mor.

À Coroa cabia o quinto do ouro e das pedras preciosas, ou seja, 20% do que era produzi­do, bem como o monopólio das especiarias. Aos donatários era proibido doar ou partilhar a capitania entre seus parentes.
A necessidade de obedecer a normas emanadas do Estado fez com se aplicas­sem ao país normas vigentes na metrópo­le, algo frequentemente considerado de menor importância, mas que integrava, como prêmio ou castigo, a população do Brasil no contexto geral do império onde vigorava a lei da metrópole.
Nas monarquias da era moderna, o soberano era o centro do poder. A justiça, portanto, ao privilegiar a vontade do monarca tornava pública a justiça penal.
As punições tinham como objetivo servir de exemplo pelo temor para os súditos.

EXEMPLO

Mesmo a pena de morte apresentava graus de sofrimento e padecimento proporcionais, diferenciando a morte natural na forca ou no pelourinho que, uma vez cumprida, autorizava o sepultamento, da morte natu­ral na forca “para sempre”, em que a forca estava localizada fora da cidade e o corpo ficaria exposto desde a morte até o dia 1º de novembro, quando era autorizado o sepultamento.
Tais rigores, em contrapartida, eram amenizados pela eventual comutação das penas e per­dão real, demonstrando outra face da justiça identificada com a imagem do rei misericordioso.
Desde a revolução de Avis se procurou chegar a uma codificação geral das leis do reino, buscando o ordenamento jurídico e tendo no Direito Romano seu referencial, se ocupando o Direito Canônico das matérias de cunho espiritual. O governo luso era fundamentado nas chamadas ordenações (nome dado às leis do reino que vigiam em todo o Reino. No entanto, havia dificulda­de para aplicação das leis nas colônias), sucessivamente Afonsinas (1446 a 1521), Manuelinas (1521 a 1603) e Filipinas (1603 a 1867).
As reformas introduzidas sob o reinado de D. Manuel (1495-1521) associaram de forma mais nítida o monarca e sua lei em um momento de expansão no ultramar. Já sob D. Sebastião (1554-1578) houve concessões à Igreja ao acatar decisões do Concílio de Trento, base da reação católica ao protestantismo.
Uma perspectiva mais ampla e duradoura foi aberta pelas Ordena­ções Filipinas, que, não obstante entrarem em vigor sob o domínio es­panhol mantiveram, em linhas gerais, as tradições legais portuguesas. Mesmo advindo a Restauração da monarquia portuguesa em 1640, as Ordenações Filipinas continuaram a vigorar.
As ordenações zelavam inclusive pela interdição do contato com po­pulações consideradas indesejáveis no reino, a exemplo de ciganos ou mouros, como verificado no livro V, ordenação 69.
Mandamos que os ciganos, assim homens como mulheres, nem outras pessoas, de qual­quer nação que sejam que com eles andarem, não entrem em nossos reinos e senhorios. E entrando, sejam presos e açoitados com baraço (laço colocado na garganta do condenado) e pregão (leitura da sentença) (Hunold Lara, p. 218).
Além do mais, temos de considerar que os limites das capitanias foram estabelecidos em razão da faixa litorânea, ou seja, a demarcação obedecia ao estipulado pela área mais conhecida, ficando impreciso o limite interior das capitanias, o que mais adiante será de grande valia para a expansão do território brasileiro, mesmo persistindo dúvidas so­bre quem seria legítimo senhor de terras em disputa.
Por outro lado, podemos dizer que as Capitanias não conseguiram ser rentáveis, mesmo com produtos como açúcar, algodão e tabaco, que, apesar da sua popularidade na Colônia, não conseguiu, nessa fase, um destaque expressivo na economia. Entretanto, em alguns casos pontu­ais, como na Capitania de Pernambuco, confiada a Duarte Coelho, os donatários tiveram sucesso em seus empreendimentos, particularmen­te no que se refere ao cultivo da cana-de-açúcar.

ATENÇÃO!!!

O rei de Portugal lançou mão de medidas para auxiliar as capitanias que, como um conjunto, fracassaram. A América portuguesa carecia de uma forma mais centraliza­da de administração. Para isso foi criado o governo-geral.

A CRIAÇÃO DO GOVERNO-GERAL

A partir de 1548, o Regimento Geral foi o instrumento por meio do qual o rei reorganizou administrativamente, por um conjunto de leis, o Brasil. O governador-ge­ral foi incumbido de coordenar a defesa da colônia, explorar o sertão, auxiliar as capitanias, que durariam até 1759.

As capitanias, ao contrário do que muitas vezes se afirma, não acabaram com a criação do governo-geral.
Apenas na época do Marquês de Pombal as capitanias seriam extintas.
O início do governo-geral eram tempos marcados pela vida rural com seus engenhos. As cidades iriam se consolidar tendo São Vicente como referência.
Basta observar o organograma anterior e verificar que a estrutura trazida do reino por Tomé de Souza, o 1º governador-geral, atende às preocupações básicas do Estado portu­guês relativas à administração de suas terras americanas.
Ao provedor-mor cabiam as funções de natureza financeira, ao capitão-mor, as relativas à defesa da colônia, e ao ouvidor-mor, àquelas pertinentes à Justiça, ou seja, os mecanis­mos básicos de controle estavam instalados em uma terra promissora.
Detalhe importante é que cada um desses cargos tinha autonomia para, no campo de sua competência, ser a maior autoridade na colônia, respeitando o comando do governador.
O ouvidor-mor exercia a justiça, observando que, naquela época, as pessoas não eram con­sideradas iguais perante a lei. Peões, índios e escravos se sujeitavam a penas muito mais seve­ras que aquelas impostas a senhores de engenho ou a fidalgos, sendo-lhes permitido conceder anistia aos réus, e como prova de sua autonomia jurídica, caso houvesse discordância entre sua posição e a do governador, o réu seria enviado a Lisboa perante as instâncias superiores.
O período de expansão marítima foi marcado pela ampliação do alcance do Direito por­tuguês. A justiça da Corte passou a ser um tribunal de apelação denominado Casa de Supli­cação, intérprete máximo do Direito português e criando jurisprudência.
No Brasil, as funções judiciais, no início, se somavam às administrativas.
A carência de juízes levou à criação na Bahia da figura de Juízes do Povo, eleitos pela po­pulação local. Ao fim do período colonial, a justiça brasileira tinha magistrados e tribunais próprios, embora as instâncias recursais derradeiras continuassem em Portugal. O que vir­tualmente aconteceu foi a diminuição dos poderes dos donatários.
O capitão-mor tinha entre suas atribuições a defesa da costa, o comando da esquadra e a repressão dos nativos rebeldes. No trato com os índios, ficou claro que as tribos receptivas ao contato com os portugueses deveriam ser tratadas como aliadas.
O provedor-mor cuidava das rendas, fiscalizava o tráfego marítimo, fazia inventários e supervisionava a escrituração.
O governador-geral promoveu a centralização da administração colonial, comprando a Capitania da Bahia, que passou a condição de capitania real. Com Tomé de Souza, vieram também os primeiros jesuítas que iriam desempenhar na América Portuguesa papel rele­vante nas relações dos portugueses com os indígenas.

ATENÇÃO!!!

Apesar dos esforços centralizadores dos governadores, é preciso reconhecer que as distâncias eram gran­des entre as capitanias, e o comércio entre elas não tinha grande importância.

Os grandes proprietários tenderam a exercer os poderes locais nas Câmaras Munici­pais, onde eram chamados “Homens Bons”. As Câmaras Municipais cuidavam da rotina das cidades e vilas, fiscalizando o comércio, a construção de estradas e cuidando para que o poder permanecesse nas mãos do seu grupo. Para tal objetivo, proibiram que judeus e estrangeiros em geral pudessem integrar essa elite. O governo-geral foi sucedido pelos vi­ce-reis no século XVIII.
Vimos os esforços reais para administrar o Brasil, com o mínimo de gasto para a coroa, daí a criação das capitanias. O sistema apresentou problemas e como Portugal decidiu ficar no Brasil, criou o governo-geral, que trouxe para a colônia o aparelho jurídico administrativo de Portugal (vide organograma).

A escravidão e a economia colonial
Tornou-se lugar-comum afirmar que o trabalho escravo forneceu as bases para a construção do Brasil, desde o período colonial até pró­ximo do final do Império brasileiro, quando a Lei Áurea libertou os escravos no país. Formalmente, porque a população negra não teve oportunidade, nos planos social e econômico, de se integrar à vida nacional, restando a eles papéis subalternos associados à pobreza material, ao analfabetismo, fazendo do negro liberto um cidadão de segunda categoria.
Além disso, são frequentes as comparações entre o destino das po­pulações negras no Brasil e aquelas da América Inglesa, tendo em vista que questões ligadas ao relacionamento de etnias suscitam discussões ligadas, em princípio, ao acesso dos negros ao mercado de trabalho e aos diferentes graus de inserção na sociedade.
Dizemos que os norte-americanos são fortemente marcados pela escravidão com aproximadamente dois séculos e meio de duração sem atentar para o fato de que, no Brasil, o período escravocrata começou pelo menos oitenta anos antes e se encerrou 23 anos depois, dando mar­gem a que muitos escravocratas empobrecidos com o fim da Guerra Ci­vil Americana, resultando na abolição da escravatura, em 1865, vissem no Brasil a chance de manter seu modo de vida.
Do século XV ao XIX, milhões de pessoas, os números variam muito e é difícil precisar, foram arrancadas do seu mundo, acorrentadas e envia­das a locais estranhos para elas, como o sul dos Estados Unidos, Cuba ou o nordeste do Brasil, entre outros, alimentando uma das atividades mais rentáveis da História, o tráfico.
Igualmente essa situação mexeu com a estrutura das várias etnias no continente africano que, por vezes, em razão de preconceito enraizado, ainda é tratado como se fosse um único país e toda sua diversidade cul­tural parece abolida em função da cor da pele de seus habitantes, não obstante as diferenças visíveis entre os diversos grupos étnicos.
A agromanufatura açucareira
A severa repressão das expedições guarda-costas não podia dar conta dos infratores, de forma que Portugal necessitou trazer para suas terras americanas um cultivo que promovesse a ocupação da terra, o açúcar.
Durante algum tempo, o termo engenho identificava o local da pro­dução de açúcar. Depois passou a indicar todo o complexo envolvido na produção e também a ordem social na qual se inseria. A estrutura familiar era de natureza patriarcal, isto é, concentrando poderes nas mãos dos se­nhores de Engenho, controlando com mão pesada sua família a partir da Casa-grande, normalmente situada em um plano elevado, próximo ao qual estavam a casa da moenda, a máquina de moer cana, a caldeira, e a senzala era onde se concentravam os escravos.
O Mercantilismo condicionou a atividade açucareira dentro da ló­gica da exploração colonial fundamentada no chamado exclusivismo metropolitano obrigando a que os produtores vendessem o açúcar aos comerciantes portugueses deles dependendo para a aquisição das ma­nufaturas, ou seja, a ordem econômica sofria a interferência da domina­ção política a determinar as trocas comerciais.
A morte do rei de Portugal, D. Sebastião, ainda jovem e sem herdei­ros, ao combater os muçulmanos no norte da África em 1578, abriu o problema da sucessão e o trono foi destinado ao candidato mais pode­roso, Felipe II, da Espanha.
Durante sessenta anos (1580-1640), Portugal e Espanha estariam unidos sob a mesma dinastia, com consequências econômicas e polí­ticas significativas para o Brasil. Um tempo longo que assistiu ao apogeu e progressivo declínio do po­der espanhol ainda à época de Felipe II, malogrando em sua tentativa de subme­ter a Inglaterra por meio da “Invencível Armada”, der­rotada pelas intempéries e pelos corsários ingleses.
Desde a Idade Média, o reino de Portugal mantinha relações de co­mércio com a região dos Países-Baixos, fazendo das cidades, como Ams­terdam, centro de recepção e distribuição de mercadorias. Os mercado­res holandeses eram os principais distribuidores de produtos orientais trazidos por Portugal, e o domínio espanhol era prejudicial aos interes­ses holandeses no Brasil associados à economia açucareira.
A organização da economia açucareira exigia muito dinheiro. A montagem de um engenho era cara, envolvendo mão de obra numerosa alimentando o tráfico de escravos africanos e, progressivamente, trans­ferindo o controle global do processo dos proprietários rurais para uma burguesia mercantil mantendo um fluxo de renda constante, tudo den­tro de crescente especialização nas atividades de produção e comércio.
O açúcar se tornaria o elemento destinado a preservar a presença dos colonizadores integrando economicamente a colônia com os mercados da Europa. A adoção da monocultura açucareira não apenas aumentou o tráfico de escravos, bem como internacionalizou a economia.
A proliferação de engenhos mudou não apenas fisicamente a apa­rência das regiões litorâneas. O emprego maciço da mão de obra escrava e sua exploração consolidou a expansão da economia açucareira.
A derrota espanhola consolida o protestantismo na Europa, bem como abre espaço para a afirmação da Inglaterra e dos Países Baixos como potências marítimas.

EXEMPLO
A produção farta em solo fértil como o de Pernambuco, por exemplo, levou a que a economia nordestina se especializasse na lavoura. Reuniam-se a grande propriedade, o trabalho escravo e a empresa mercantil fornecendo as bases do sistema econômico.

Estava caracterizado o chamado Pacto Colonial, assegurando à me­trópole o monopólio do comércio colonial, conciliando interesses dos produtores brasileiros e os dos comerciantes portugueses. Os senhores de engenho conseguiam bom preço para o açúcar e os negociantes lusos ganhavam com o transporte e a revenda da mercadoria bem como por trazer produtos europeus aos colonos e, principalmente, com o tráfico de escravos.



A economia açucareira criou mercado a ser atendido dentro da pró­pria colônia. Centrados na produção açucareira, os senhores de engenho estimularam a produção de alimentos no interior, impulsionando principalmente a pecuária de corte com destaque para as regiões do Vale do Rio São Francisco e na região do Piauí. Para os paulistas, a tendência foi desenvolver a penetração e o desbravamento do interior visando o apresamento dos indígenas, o que os levou a entrar em terras sujeitas legalmente a Espanha, pelo Tratado de Tordesilhas.
Na verdade, dentro da União Ibérica, mesmo considerando a dominação espanhola, não se pode ignorar que uma parcela da elite de Portugal acabava se beneficiando dela. A ideia era participar de alguma forma da circulação de riquezas da América Hispânica.
Ao falar das invasões holandesas no Brasil, torna-se necessário ter uma ideia de como essa sociedade se organizou. O poder nas terras holandesas se concentrou em uma repúbli­ca de ricos mercadores, receptiva aos empreendedores, o que incluía os judeus, persegui­dos pela Inquisição nos países ibéricos.
A criação da Companhia das Índias Ocidentais, em 1621, em moldes semelhantes a sua coirmã a Companhia das Índias Orientais, deixa claro o objetivo essencialmente mercantil da conquista do nordeste açucareiro do Brasil. O empreendimento, tanto na primeira ten­tativa na Bahia, em 1625, de curta duração, quanto os 24 anos transcorridos desde a toma­da de Pernambuco, em 1630, foi determinado por razões comerciais e também de natureza política, uma vez que a Holanda havia se libertado do domínio espanhol, e o Brasil, sob a União Ibérica, constituía um alvo atrativo.
A presença holandesa no nordeste refletia os costumes e a estrutura política de uma so­ciedade estruturada em bases urbanas, contrastando com o interior das terras brasileiras, situação que permaneceu mesmo em momentos de maior esforço para expulsar o invasor, a exemplo da Insurreição Pernambucana de 1645, ou seja, uma identidade luso-brasileira construída em função do mundo rural opondo-se ao mundo urbano dos colonizadores.
REFLEXÃO
Sobre a presença holandesa no Brasil, cabe uma observação sobre o conde Maurício de Nassau, represen­tativo do Brasil holandês. Nassau assimilou a problemática do relacionamento entre os grandes senhores de engenho e as autoridades holandesas. Motivados principalmente pelo receio de aumento dos impostos dos produtores brasileiros, os holandeses procuraram manter o status quo, negociando com Portugal que desde 1640 havia recuperado sua independência, com o final da União Ibérica.
Deve-se ter na devida conta que a presença holandesa no nordeste foi um empreendimen­to essencialmente comercial, tornando pouco aceitável a ideia de que sua colonização seria a mais adequada ao Brasil, uma vez que, por prin­cípio, atividades coloniais beneficiam a metró­pole e uma elite colonial a ela vinculada.
De concreto, temos o registro de que os ho­landeses, após sua expulsão do Nordeste, em 1654, se dirigiram às Antilhas e, por conta dos conhecimentos adquiridos no Brasil, benefi­ciados por distâncias que permitiam baratear o transporte das mercadorias, provocaram o declínio da economia açucareira nordestina.
As hipóteses ligadas à colonização holandesa podem ser confrontadas com a trajetória da colonização holandesa na Indonésia e na região da África do Sul.


ATENÇÃO!!!

Mesmo considerando que os preços do açúcar não se mantiveram altos, a produção açucareira não decli­nou, refletindo a complexidade da economia colonial. A pecuária ocupava espaços no interior e produtos como o tabaco e o algodão ampliavam sua importância.

A produção de ouro na região das Gerais permitiu ao reino português viver um período de opu­lência cujo declínio já se verifica após 1760. A busca pelo ouro, no século XVII, foi responsável por um êxodo populacional que deu nova face à colônia. Estima-se que mais de cem mil pessoas vieram à região das minas.
Evidentemente a metrópole não foi indiferente ao êxito da mineração e aumentou os mecanismos de controle da economia colonial. A Coroa preci­sava de ouro em quantidades crescen­tes para saldar seus compromissos, principalmente com a Inglaterra, de quem Portugal se tornou uma econo­mia dependente.
Pessoas de variada condição social chegaram à região das minas, na esperança de fazer fortuna fácil com o garimpo. Aventureiros de toda espécie vinham à área de mineração.
Acontece que o Direito não se antecipa à realidade, mas regula as atividades humanas pelo conhecimento e bom senso. Em um primeiro momento, a descoberta de riqueza metálica literalmente joga milhares de pessoas na região das minas agitada pela possibilidade de ficar rico sem o controle do fisco, pois o Estado não dispõe de soldados para im­por a ordem e administradores para supervisionar o cumprimento das determinações reais.
O Portugal da Restauração, após a União Ibérica, apresentava uma condição muito distinta da época em que se firmou a aliança com os britânicos. As lutas contra os holandeses, a guerra da Restauração e o declínio do comércio com o oriente enfraqueciam os portugueses. Os ingleses, por sua vez, se afirmavam como potência marítima, principal­mente após o Ato de Navegação, e passaram a ter controle inclusive do tráfico de escravos.
Além disso, no século XVIII, a In­glaterra levou a dianteira em relação aos demais países com a chamada Revolução Industrial, o que tornou mais difícil a posição de Portugal, com reflexos na colônia brasileira.
A mineração provocou uma alteração profunda na vida colonial. Nos primeiros tempos a presença europeia era essencialmente rural com­pondo uma elite controladora dos engenhos e culturas agrícolas. Mes­mo as pessoas ricas levavam uma vida simples em sua maioria. O surgi­mento das cidades mudou as regras do jogo.
A sociedade das minas permitiu que muitas pessoas livres e pobres buscassem oportunidades de mudar de vida em um contraste nítido com o mundo mais fechado da sociedade baseada na produção açuca­reira do Nordeste. Uma sociedade com mais esperança. Uma sociedade em que descobrir uma jazida muda a vida de uma hora para outra, ao contrário da rotina da empresa açucareira do Nordeste.
Enquanto o ouro foi abundante, as minas ostentaram riqueza em suas cidades.
A mineração provocou uma alteração profunda na vida colonial. Nos primeiros tempos a presença europeia era essencialmente rural com­pondo uma elite controladora dos engenhos e culturas agrícolas. Mes­mo as pessoas ricas levavam uma vida simples em sua maioria. O surgi­mento das cidades mudou as regras do jogo.
A sociedade das minas permitiu que muitas pessoas livres e pobres buscassem oportunidades de mudar de vida em um contraste nítido com o mundo mais fechado da sociedade baseada na produção açuca­reira do Nordeste. Uma sociedade com mais esperança. Uma sociedade em que descobrir uma jazida muda a vida de uma hora para outra, ao contrário da rotina da empresa açucareira do Nordeste.

ATENÇÃO!!!
O ouro e os diamantes foram responsáveis pela colonização do território e promove­ram o surgimento de vilas e povoados. A migração não se limitou à chegada de gente da metrópole, na própria colônia houve pessoas que se deslocaram de vários cantos do Brasil, enfrentando perigos como ataques de índios ou de animais nas regiões a serem atravessadas para o destino final.
Além disso, ocorreu um fenômeno comum às áreas apontadas como as de grande prosperidade. A tendência à elevação geral de preços, o que comprometia a so­brevivência dos que lá chegavam. Enfim, para muitos, o ouro era uma miragem, e a pobreza, uma realidade.
O Estado português tratou de regulamentar a exploração de riquezas e, para isso, instituiu a Intendência de Minas visando supervisionar as con­cessões de terra para a mineração e controlar as relações entre os minera­dores. Entre os pré-requisitos para participar da exploração aurífera esta­vam ter, ao menos, 12 escravos para trabalhar nas datas.
Não é preciso uma grande informação do processo como um todo para imaginar que a sonegação de informações sobre o ouro encontrado fosse elevada. Às autoridades interessava a parte do Leão nos tributos sobre a produção de riqueza. Algo fácil de entender em nossos dias.
As condições de trabalho nas minas eram muito sofridas, particu­larmente nas galerias subterrâneas sujeitas a desastres. Mesmo con­siderando todos esses fatores desfavoráveis, podemos registrar uma acentuada urbanização nas Gerais, permitindo que muitas atividades profissionais, antes de pouco significado ou inexistentes, ganhassem força na capitania. Com efeito, médicos, artesãos, músicos, escritores, juntamente com funcionários da metrópole viviam em cidades com ele­vado nível de riqueza. Não se tratava de “mais do mesmo”. A mineração permitiu a formação de um rico patrimônio cultural na região.
O enriquecimento da região numa época em que Portugal da restau­ração se encontrava crescentemente endividado resultou numa taxação abusiva. Antes se aplicavam às Ordenações Manuelinas de 1532, estipu­lando que um quinto do minério seria propriedade real. A estes foram acrescentados tributos tão onerosos que levaram a decadência das Minas.
A economia brasileira, no período colonial, atendeu aos interesses da metrópole tendo no açúcar o elemento de fixação de Portugal como potência colonial na América.
Depois do fim da União Ibérica e de os holandeses serem expulsos, levando o cultivo do açúcar para a região das Antilhas, nossa produção entrou em decadência.
Com a descoberta das minas, a colonização interiorizou-se e houve uma urbanização nessas áreas produtoras, provocando a chegada de muitos migrantes.

ATIVIDADE DO CAPÍTULO I (ENVOLVE AS QUESTÕES 1 E 6)

Questão 1 (ENADE/ 2012 — questão 8)
A globalização é o estágio supremo da internacionalização. O processo de intercâmbio entre países, que marcou o desenvolvimento do capitalismo desde o período mercantil dos séculos XVII e XVIII, expande-se com a industrialização, ganha novas bases com a grande indústria nos fins do século XIX e, agora, adquire mais intensidade, mais amplitude e novas feições. O mundo inteiro torna-se envolvido em todo tipo de troca: técnica, comercial, financeira e cultural. A produção e a informação globalizadas permitem a emer­gência de lucro em escala mundial, buscado pelas firmas globais, que constituem o verdadeiro motor da atividade econômica (Adaptado de: SANTOS, M. O país distorcido. São Paulo: Publifolha, 2002).
No estágio atual do processo de globalização, pautado na integração dos mercados e na competitividade em escala mundial, as crises econômicas deixaram de ser problemas locais e passaram a afligir pratica­mente todo o mundo. A crise recente, iniciada em 2008, é um dos exemplos mais significativos da conexão e interligação entre os países, suas economias, políticas e cidadãos. Considerando esse contexto, avalie as seguintes asserções e a relação proposta entre elas.
I. O processo de desregulação dos mercados financeiros norte-americano e europeu levou à formação de uma bolha de empréstimos especulativos e imobiliários, a qual, ao estourar em 2008, acarretou um efeito dominó de quebra nos mercados.
POR QUE
II. As políticas neoliberais marcam o enfraquecimento e a dissolução do poder dos Estados nacionais, bem como asseguram poder aos aglomerados financeiros que não atuam nos limites geográficos dos países de origem.
A respeito dessas asserções, assinale a opção correta.
a) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa da I.
b) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma justificativa da I.
c) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
e) As asserções I e II são proposições falsas.

Questão 2 (Sistema Político e Direito Internacional)
“As guerras religiosas e as ambições universais das dinastias Bourbon, Habsburgo e do Santo Império Romano Germânico, nos idos dos séculos XVI e XVII, levaram à assinatura dos Acordos de Westphalen, em 1648. Com o objetivo de frear a Guerra dos Trinta Anos (1618–1648) e promover a reorganização das unidades estatais no que tange a religião, os tratados ultrapassaram tais funções tornando-se peça fundadora do Sistema Internacional Moderno.” (SILVA, Francisco Carlos Teixeira da. Impérios na História. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. p. 145)
Considerando o texto acima identifique a assertiva correta:
— O Sistema Internacional surgido ao fim da Guerra dos Trinta Anos:
a) Identificou a falência da ordem política internacional baseada no princípio da não intervenção.
b) Consagrou os princípios basilares da continuidade no tempo e das fronteiras estáveis transmitidos pelos romanos aos visigodos como alicerce da diplomacia.
c) Condicionou a arbitragem de litígios na área da Cristandade a aceitação da liderança dos Papas confor­me disposto no IV concílio de Latrão.
d) Reconheceu no Estado autonomia no trato de seus assuntos domésticos rejeitando a ideia de uma autoridade política suprema.
e) Assimilou as concepções políticas autocráticas do Império Romano do Oriente para enfrentar a ameaça dos otomanos.

Questão 3 (Administração Colonial e Ordem Jurídica)
“... Com efeito, a noção de que as decisões cabiam, em última instância ao soberano, conferia à Forma­ção Social Brasileira, na conjuntura, uma coerência ideológica na qual a desigualdade era assumida e conscientemente legitimada.” (Albuquerque, Manuel Maurício de. Pequena história da formação social brasileira. 3. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1984. p. 226)
De acordo com o texto acima podemos dizer que a organização jurídica da colônia brasileira obedeceu à orientação do poder real, sendo colocada em prática pelo Governo Geral que:
a) Recorreu ao exemplo da França, elaborando um código colonial muito mais rígido que o metropolitano.
b) Incumbiu o ouvidor-mor de organizar a justiça, deixando as instâncias finais para Lisboa, onde funcio­nava a Casa de Suplicação.
c) Instalou no Brasil os Tribunais do Santo Ofício para combater heresias
d) Deixou a cargo dos “Homens Bons”, núcleo do latifúndio, o combate ao criptojudaismo.
e) Organizou a partilha das terras indígenas e controlou o tráfego marítimo utilizando os serviços do ouvidor-mor.

Questão 4 (Economia colonial)
A escravidão, prática de longa duração, marcou profundamente a sociedade brasileira desde as primeiras levas chegadas ao Nordeste no século XVI o que nos permite concluir que:
a) Constituiu uma prática inovadora na História, o que explica sua rápida expansão a partir da África, atin­gindo até a Ásia.
b) Manteve o Brasil, em plena era da segunda revolução industrial, como o último país do mundo a, legalmente, abolir a escravidão.
c) Trouxe para as regiões litorâneas do Nordeste uma alternativa barata para substituir a mão de obra indígena, mais especializada, porém rebelde.
d) Deixou o Brasil muito mais rico com o emprego na mineração, muito embora tenha tido um começo tardio, um século depois das Treze Colônias da América receberem seus escravos da África Ocidental.
e) Representou um atrativo de tanta importância que levou os holandeses a invadir Angola para obter mão de obra para suprir as atividades açucareiras, mostrando como o tráfico de escravos articulava interesses nos três continentes.


CÓDIGO CRIMINAL DE 1830
NÃO ESTÁ INCLUÍDO EM NENHUM CAPÍTULO DO LIVRO DIDÁTICO
TÓPICO RETIRADO DO LIVRO DA FLÁVIA LAGES
(ENVOLVE A QUESTÃO 2)

O Código Criminal de 1830 foi o primeiro código penal brasileiro, sancionado poucos meses antes da abdicação de D. Pedro I, em 16 de dezembro de 1830. Vigorou desde 1831 até 1891, quando foi substituído pelo Código Penal dos Estados Unidos do Brasil (Decretos ns. 847, de 11 de outubro de 1890, e 1.127, de 6 de dezembro de 1890).

Principais características

Até 1830 se tem a vigência das Ordenações Filipinas (punição cruel). Então, o Código Criminal de 1830 vai avançar em relação às leis filipinas no que diz respeito à integridade física. Com a inviolabilidade dos direitos civis, igualdade jurídica em uma sociedade escravista. Saindo da pena do castigo exemplar para a pena moderna: respeito à integridade física.

Crimes segundo o código criminal de 1830:

Públicos:
·         crimes contra o Império;
·         contra a tranquilidade interna do Império;
·         contra a administração;
·         o tesouro e a propriedade pública.

Privados:
·         contra a liberdade e a segurança individual;
·         contra a propriedade particular.

Policiais:
·         contra as normas policiais e regras públicas (posturas municipais).

Penas:
·         proporcionalidade entre o crime e a pena (as penas tinham que ter proporcionalidade entre o crime cometido e a pena);
·         a pena exclusiva do condenado não poderia ultrapassar ao infrator, não podendo ser estendida aos seus familiares;
·         humanização da pena de morte, sem a tortura;
·         proibição das penas cruéis, sem enforcamentos e decapitações, etc;
·         persistência das penas de degredo, banimento, galés, multas, privação dos direitos políticos, desterro (exílio);
·         ainda persistem algumas penas das ordenações Filipinas.

Estrutura

O Código de 1830 é dividido em quatro partes: (Dos Crimes e das Penas; Dos Crimes Públicos; Dos Crimes Particulares e dos Crimes Policiais), com um total de oito capítulos, divido em títulos e seções, ao qual, contêm ou não, especificações sobre os crimes e as penas, em cada uma dessas subdivisões.

Parte Primeira - Dos Crimes, e Das Penas
Essa parte trata de como são os crimes, e de como deverão ser aplicadas suas penas, Suas temáticas são:

Título I - Dos Crimes

Do artigo 1 ao 13, têm-se definido os crimes e os criminosos, e como deveriam ser aplicadas as penas, reunidas em seis grupos básicos:
a) crimes;
b) criminosos;
c) crimes justificáveis;
d) circunstâncias agravantes;
e) atenuante dos crimes;
f) satisfação.

Alguns Pontos do Código Criminal

Uma das maiores discussões durante a feitura do Código Criminal residiu na penalização dos crimes. A pena de morte foi o centro da discussão, os deputados e senadores que participaram da Comissão que analisou o projeto chegaram inclusive a colocar a discussão e a conclusão acerca deste tipo de pena no parecer do Projeto. No final, apesar da docilidade do povo brasileiro, e sua ignorância, inclusive escolar, seria usada como desculpa para impedir a suspensão da pena de morte.
A pena de morte era então prevista no primeiro Código brasileiro e não somente prevista como era descrita a sua execução. Ao legislador não escapou sequer a indicação da proibição de pompa no enterro do condenado após a aplicação da pena e do tipo de roupa do condenado no momento da execução:

"Art 38. A pena de morte será dada na forca."

"Art. 39. Esta pena, depois que se tiver tornado irrevogável a sentença, será executada no dia seguinte ao da intimação, a qual nunca se fará na véspera de domingo, dia santo ou de festa nacional."

"Art. 40. O réo, com seu vestido ordinário, e preso, será conduzido pelas ruas mais publicas até a forca, acompanhado do juiz criminal do lugar onde estiver, com seu Escrivão, e da força militar que se requisitar. Ao acompanhamento precederá o porteiro, lendo em voz alta a sentença que se fôr executar."

"Art. 42. Os corpos dos enforcados serão entregues a seus parentes ou amigos, se os pedirem aos juízes que presidirem à execução; mas não poderão enterrai-os com pompa, sob pena de prisão por um mez à um anno."

Apenas a mulher grávida poderia, temporariamente, escapar do castigo da morte:

''Art. 43. Na mulher prenhe não se executará a pena de morte, nem mesmo ella será julgada, em caso de a merecer, senão quarenta dias depois do parto."

Outras penas eram previstas: a de Galés, a de prisão com trabalho, a de prisão simples, o banimento, a de degredo, a de desterro e a maioria delas suspendia os direitos políticos do condenado:

''Art. 44. A pena de galés sujeitará os réos a andaram com calceta no pé e corrente de ferro, juntos ou separados, e a empregarem nos trabalhos publico da província onde tiver sido commettido o delicto, à disposição do governo."

"Art 46. A pena de prisão com trabalho obrigará aos réos a occuparem-se diariamente no trabalho
que lhes fôr destinado dentro do recinto das prisões, na conformidade das sentenças e regulamentos policiaes das mesmas prisões."

''Art. 46. A pena de prisão simples obrigará aos réos a estarem reclusos nas prisões publicas pelo
tempo marcado nas sentenças."

''Art. 50. A pena de banimento privará para sempre os réos dos direitos de cidadão brasileiro, e os inhibirá perpetuamente de habitar o território do Império. Os banidos que voltarem ao território do Império serão condemnados à prisão perpetua."

''Art. 51. A pena de degredo obrigará os réos a residirem no lugar destinado pela sentença, sem poderem sahir delle, durante o tempo que a mesma lhes marcar. A sentença nunca destinará para degredo lugar que se comprehenda dentro da comarca em que morar o offendido."

''Art. 52. A pena de desterro, quando outra declaração não houver, obrigará os réos a sahir dos termos dos lugares do delicto, e da principal residência do offendido, e a não entrar em algum delles durante o tempo marcado na sentença."

''Art. 53. Os condemnados às Galés, à prisão com trabalho, à prisão simples, a degredo ou a desterro ficão privados do exercício dos direitos políticos de cidadão brasileiro, enquanto durarem os effeitos da condemnação."
Havia também a pena de multa, com a introdução da idéia do "diamulta" tão utilizada hoje em dia:

''Art. 55. A pena de multa obrigará os réos ao pagamento de uma quantia pecuniária, que será sempre regulada pelo que os condemnados puderem haver em cada um dia pelos seus bens, empregos ou indústria, quando a lei especificadamente a não designar de outro modo."

"Art. 57. Não tendo os condemnados meios para pagar as multas, serão condemnados em tanto quanto tempo de prisão com trabalho, quanto fôr necessário para ganharem a importância dellas."

Ainda havia a indicação como pena para casos de delitos no exercício de emprego público e perda do emprego:

''Art. 58. A pena de suspensão do emprego privará os réos do exercício dos seus empregos durante o tempo da suspensão, no qual não poderão ser empregados em outros, salvo sendo de eleição popular."

Ainda no tocante às penas, havia uma garantia constitucional que afirmava não poder haver penas como os açoites, a tortura, a marca de ferro quente, e todas as mais penas cruéis (art. 179, inciso 19). Esta afirmação constitucional não excluía ninguém, aliás nem poderia, visto que o inciso 13 do mesmo artigo da Constituição Outorgada decretava que a lei deveria ser igual para todos. Todos menos os escravos, que eram considerados coisas por um lado e pessoas no caso de delitos:

"Art. 60. Se o réo fôr escravo, e incorrer em pena que não seja a capital ou de galés será condemnado à de açoutes, e, depois de os soffrer, será entregue a seu senhor, que se obrigará a trazei-o com um ferro pelo tempo e maneira que o juiz o designar. O número de açoutes será fixado na sentença; e o escravo não poderá levar por dia mais de cincoenta."

Deve-se ressaltar que o Código não imputava pena por não julgar como criminosos nem os menores de quatorze anos, nem os "loucos de todo gênero" e as pessoas que cometeram um crime levados por força ou medo "irresistíveis". Estes deveriam apenas reparar o mal causado e, se fossem menores de 14 anos considerados como tendo discernimento eram recolhidos a casas de correção (artigos 11, 12 e 13):

"Art. 10 - Também não se julgarão criminosos:
1º Os menores de quatorze annos.
2º Os loucos de todo o gênero, salvo se tiverem lúcidos intervallos e nelles commetterem o crime.
3º Os que commetterem crimes violentos, por força ou por medo irresistíveis. "

O Código Criminal apesar das falhas leva consigo princípios muito importantes de Justiça. Sem dúvida Beccaria tem seu papel na cabeça dos homens que fizeram o Código. Pode-se ver, por exemplo, o valioso Princípio da Legalidade que no Código Criminal somente não foi perfeito por permitir ainda o arbítrio:

"Art. 1º Não haverá crime ou delicto (palavras synonimas neste Código) sem uma lei anterior que o qualifique."

"Art. 33. Nenhum crime será punido com penas que não estejão estabelecidas nas leis, nem com mais ou menos daquellas que estiverem decretadas para punir o crime no gráo maximo, médio ou mínimo, salvo o caso que aos juízes se permitir arbítrio."

Há também defeitos graves, como a não indicação e qualificação do crime culposo. Esta falha somente terá fim em 1871 através de uma lei complementar:

"Art. 3º Não haverá criminoso ou delinqüente sem má-fé, isto é, sem conhecimento do mal e intenção de o praticar."

O Código é bastante rígido com juízes, suas funções e suas obrigações, tanto no que diz respeito ao recebimento de suborno para dar sentenças, quanto no não cumprimento de prazos:

"Art. 130. Receber dinheiro ou outro algum donativo, ou aceitar promessas, directa ou indirectamente, para praticar ou deixar de praticar, algum acto de officio contra ou segundo a lei.
Penas: de perda do emprego com inhabilidade para outro qualquer; de multa igual ao tresdobro da peita; e de prisão por três a nove mezes. A pena de prisão não terá lugar quando o acto em vista do qual se recebeu ou aceitou a peita se não tiver effectuado."

"Art. 131. Nas mesmas penas incorrerá o Juiz de Direito, de Facto ou Árbitro, que por peita der sentença, posto que justa seja. Se a sentença fôr injusta, a prisão será de seis mezés a dous annos; e se fôr criminal condemnatória, soffrerá o peitado a mesma pena, que tiver imposto ao que condemnára, menos que a de morte, quando o condemnado não tiver soffrido; caso em que se imporá ao réo a de prisão perpétua. Em todos estes casos, a sentença dada por peita será nulla."

"Art. 180. ( ... ) Demorar o Juiz o processo do réo preso, ou afiançado além dos prazos legaes; ou faltar aos actos do seu livramento.
Pena: de suspensão do emprego por um mez a um anno, e de prisão por quinze dias a quatro mezes; nunca porém por menos tempo que o da prisão do offendido,e de mais a terça parte."

"Art. 182. Não dar o Juiz ao preso, no prazo marcado na Constituição, a nota por elle assignada, que contenha o motivo da prisão, e os nomes do acusador, e das testemunhas, havendo-as.
Pena: de prisão por cinco dias a um mez."

Os crimes sexuais também eram rigidamente punidos no Código Criminal do Império, mas esta punição ocorreria de maneira mais contundente se a mulher, única vítima possível por esta legislação, fosse considerada socialmente como sendo "de família", no caso de ser prostituta a pena era mais leve:

"Art. 222. Ter cópula carnal por meio de violência, ou ameaças, com qualquer mulher honesta.
Pena: de prisão por três a doze annos, e de dotar a offendida.
Se a violentada for prostituta:
Pena: de prisão por um mez a dous annos. "

A defloração seria crime se ocorrido com uma moça menor de dezessete anos e o casamento era a alternativa para a pena:

"Art. 219. Deflorar mulher virgem, menor de dezesete annos.
Pena: de desterro para fora da comarca, em que residir a deflorada, por um a três annos, e de dotar a esta. Seguindo-se o casamento, não terão lugar as penas."

O adultério é considerado crime por este código e apresenta uma das situações mais interessantes vistas por nós em códigos antigos.
Para a mulher, adultério era adultério, qualquer que fosse a forma; para o homem somente era considerado adultério se ele mantivesse uma outra mulher (até aqui é semelhante ao que ocorria nas Ordenações), entretanto, para que a denúncia deste crime valesse, era preciso que o cônjuge traído o fizesse e provasse que nunca, em nenhum momento consentiu no adultério.
É um crime que se consentido não se configura mais como tal? A mulher tinha como denunciar o marido imediatamente assim que soubesse da existência de uma "teúda e manteúda"? Não se pode esquecer do poder patriarcal que muitas vezes se traduzia em violência e medo nos seios das famílias, das mais ricas às mais pobres:

''Art. 250. A mulher casada que commeter adultério será punida com a pena de prisão com trabalho por um a três annos."

"Art. 251. O homem casado, que tiver concubina, teúda e manteúda, será punido com as penas do artigo antecedente."

"Art. 252. A accusação deste crime não será permitida a pessoa que não seja marido, ou mulher, e estes mesmos não terão direito de accusar, se em algum tempo tiverem consentido no adultério."

Quanto aos crimes contra a propriedade, o Código não diferencia furto de roubo, usa ambas as expressões, inclusive, em um só artigo, como sinônimos:

"Art. 257. Tirar cousa alheia contra a vontade do dono, para si ou para outro."

"Art. 269. Roubar, isto é, furtar, fazendo violência a pessoas ou às coisas.
Pena: de galés por um a oito anos."

Destaca-se também que atos religiosos eram também considerados crimes se praticados em público. A Constituição Imperial afirmava ser a religião Católica a oficial do Estado, os proventos de religiosos católicos no Brasil saíam dos cofres públicos, mas havia, em contrapartida o inciso 5º do artigo 179, da mesma Constituição, que afirmava: "Ninguém pode ser perseguido por motivo de religião, uma vez que respeite a do Estado, e não ofenda a moral pública". Mas ofendia a moral pública expressar-se religiosamente em público com outro culto que não fosse o católico:

''Art. 276. Celebrar em casa, ou edifício, que tenha alguma forma exterior de templo, ou publicamente em qualquer lugar, o culto de outra religião que não seja a do Estado.
Pena: de serem dispersos pelo Juiz de Paz os que estiverem reunidos para o culto; da demolição da forma exterior; e da multa de dous a doze mil réis, que pagará cada um."

No âmbito da responsabilidade destaca-se o fato do legislador imperial ter imposto a responsabilidade sucessiva, bem antes de os belgas (que levam a fama de terem tido esta idéia) o terem feito. Isto ocorre nos crimes de imprensa:

''Art. 7º - Nos delictos de abuso da liberdade de communicar os pensamentos, são criminosos, e por isso responsáveis:

1º O impressor, gravador ou lithographo, os quaes ficarão isentos de responsabilidade, mostrando por escripto obrigação de responsabilidade do
editor, sendo este pessoa conhecida, residente no Brazil, que esteja no gozo dos Direito Políticos;
( ... )
2º O editor que se obrigou, o qual ficará isento de responsabilidade, mostrando a obrigação pela qual o autor se responsabilize, tendo este as mesmas qualidades exigidas no editor, para escusar o impressou.
3º O autor que se obrigou.
4º O vendedor ... "


CAPÍTULO II
Liberdade, liberdade, abre as asas sobre nós - o processo de independência
O Império português em tempos de crise
As conjurações mineira e baiana (1789-1798)
A transferência da Corte portuguesa para as Américas,
ou o início do processo de “interiorização da metrópole”
A Revolução do Porto e a emancipação da América portuguesa
(ENVOLVE AS QUESTÕES 3 E 5)

A Corte portuguesa veio para o Brasil em 1808, iniciando-se o período do Império, marco inicial de um processo que culminaria com a independência do Brasil, alguns anos mais tarde.
No entanto, antes de voltarmos nosso olhar para o processo de eman­cipação da chamada América portuguesa de sua metrópole europeia, relembraremos algumas das principais rebeliões ocorridas no período colonial, que evidenciam a existência de fissuras na relação colônia/me­trópole desde meados do século XVII.
Geralmente motivadas por questões de ordem econômica, essas re­beliões expressavam o descontentamento da população local em rela­ção ao excessivo controle da metrópole sobre as províncias coloniais.
Independência ou construção do Brasil? Essa é uma pergunta que tentaremos responder.

tabela abaixo, que descreve detalhadamente alguns desses movimentos:


Guerra dos Emboabas
Guerra dos Mascates
Revolta dos Beckman
Revolta de Felipe dos Santos
Quando
1708
1709
1709
1684
1720
Onde
Minas Gerais
Pernambuco
Pernambuco
Maranhão
Vila Rica
Quem
Paulistas contra colonos baianos e portugueses, pe­jorativamente chamados de Emboabas
Comerciantes de Recife de­nominados pejorativamente de "Mascates" contra fazen­deiros de Olinda

Comerciantes de Recife de­nominados pejorativamente de "Mascates" contra fazen­deiros de Olinda
População maranhense contra os jesuítas e os go­vernantes
Mineiros e escravos contra o Governo
Por quê
Disputa entre paulistas, pri­meiros a encontrarem ouro na região, e "forasteiros" pelo monopólio das regiões mineradoras recém-desco­bertas
Ascensão comercial do re­cife transformou este no centro econômico de Per­nambuco. Comerciantes do local queriam autonomia po­lítica que estava nas mãos dos fazendeiros de Olinda decadentes com a crise do açúcar e, por determinação Real, conseguiram-na, cau­sando a revolta dos olinden­ses

Ascensão comercial do re­cife transformou este no centro econômico de Per­nambuco. Comerciantes do local queriam autonomia po­lítica que estava nas mãos dos fazendeiros de Olinda decadentes com a crise do açúcar e, por determinação Real, conseguiram-na, cau­sando a revolta dos olinden­ses
A pedido dos jesuítas, o go­verno português proibiu a escravidão indígena, princi­pal mão de obra das lavou­ras do Maranhão, levando ao uso de mão de obra es­crava negra, que seria as­segurada pela então criada Companhia do Comércio do Maranhão (1682). Essa Companhia usufruía do mo­nopólio comercial, inflacio­nou os produtos de abaste­cimento e não cumpriu com o abastecimento de escra­vos, causando desconten­tamento geral da população.
Revolta contra a rigorosa política fiscal e opressiva tributação. A causa imedia­ta foi a criação das Casas de Fundição onde 20% do ouro extraído era confiscado como imposto à Portugal
Como
A rivalidade levou a um conflito armado no qual os Emboabas venceram por estarem em maior número, possuírem mais armamen­tos e estarem apoiados por Portugal
Os olindenses invadiram Re­cife e os conflitos duraram até 1710, quando o novo governador foi enviado à Pernambuco, prendendo os revoltosos

Os olindenses invadiram Re­cife e os conflitos duraram até 1710, quando o novo governador foi enviado à Pernambuco, prendendo os revoltosos
Chefiados por Manuel e Thomas Beckman, os co­lonos se rebelaram, expul­sando os jesuítas, abolindo a Companhia e formando um governo, que duraria até quase 1 ano, até que novo governador fosse enviado ao Estado do Maranhão pelo governo Real
Rebeldes fazem suas exi­gências ao governador, que fingiu aceitá-las até que conseguisse organizar uma ofensiva, reunindo forças militares necessárias
Conse­quências
Criação da capitania de São Paulo e Minas e ida dos paulistas à região de Mato Grosso e Goiás (expansão territorial e descoberta de novas minas)
Nomeação de Recife como sede administrativa de Per­nambuco

Nomeação de Recife como sede administrativa de Per­nambuco
Extinção da companhia de Comércio, volta dos jesuítas para Maranhão e morte, exí­lio ou prisão dos líderes do movimento
Aprisionamento ou exílio dos rebeldes, enforcamento de Felipe dos Santos, apli­cação das Casas de Fundi­ção e separação das capita­nias de São Paulo e Minas Gerais, aumentando a auto­ridade Real sobre ambas.

Ao observarmos a tabela, é possível notar que duas de suas rebeliões ocorreram na mesma localidade: a região minerado­ra. Desde a descoberta de ouro na região, no ano de 1695, hou­ve grande deslocamento para o local, resultando no acirramen­to dos conflitos entre a popula­ção nativa e os migrantes pelo controle de territórios e das minas de extração aurífera, altamente lucrativas.
A intensa extração de metais preciosos no local, aliada ao interesse metropolitano no melhor aproveitamento das riquezas coloniais, resultou na adoção de uma série de medidas de controle por parte de Portugal.
Entre as medidas podemos citar:
• O surgimento da intendência das minas e das casas de fundição;
• A criação do Quinto real e da derrama.
A aplicação dessas medidas e a punição àqueles que as descumpriam variava de intensidade, sendo mais branda em alguns momentos e mais severa em outros. Nos momentos de controle mais intenso, estouravam movimentos contestatórios como a Revolta de Felipe dos Santos (1720), presente na tabela mostrada anteriormente.
Foi, entretanto, cerca de setenta anos mais tarde que ocorreu no mesmo lugar uma das rebeliões coloniais mais estudadas da História do Brasil: a Inconfidência, ou Conjuração Mineira.

As conjurações mineira e baiana (1789-1798)

Com certeza, vocês já ouviram falar de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiraden­tes. Ele é con­siderado um dos grandes heróis nacio­nais, um mártir, que sacrificou a própria vida em nome da nação brasileira.
Líder da chamada Inconfidência Mi­neira, teria protagonizado o primeiro grande movimento de emancipação na­cional ocorrido na colônia. Entretanto, afinal, quem foi Tiradentes, inconfidente ou herói nacional? E a Inconfidência Mineira foi realmente um movimen­to visando à independência do Brasil ainda no século XVIII?
De acordo a versão do Dicionarioweb, a inconfidência mineira foi um movimento patriótico e de alcance nacional visando à independên­cia do Brasil. No entanto, novas interpretações sobre o movimento têm surgido em estudos acadêmicos mais recentes.
O termo inconfidência, anteriormente muito utilizado, tem sido menos visto nos trabalhos sobre o assunto, pois nomeá-lo dessa forma significaria ratificar a interpretação oficial da história, segundo a qual os inconfidentes, ao se rebelar, foram traidores e infiéis para com a Coroa portuguesa.
Por essa razão, o termo conjuração tem sido mais utilizado pelos pesquisadores e acadêmicos, pois ele traduz exatamente o que ocorreu em Minas Gerais: um movimento conspiratório que visava a romper os laços de dependência entre a região e o Império português.
Além da revisão historiográfica, ligada à forma como o movimento foi nomeado, a pesquisa histórica mais recente também produziu novas interpretações sobre as motivações, os interesses e a forma como o mo­vimento foi interpretado por historiadores do século XIX: hoje é sabido que a transformação da conjuração mineira em movimento patriótico e nacionalista, assim como a elevação de Tiradentes ao status de herói na­cional, ocorreu em fins do século XIX, e obedeceu aos interesses ligados à (re)construção de uma identidade nacional para o país.
Como discutiremos adiante, o país que hoje chamamos de Brasil, que possui sua língua, sua história e seus costumes próprios, e cujos habitantes são chamados de brasileiros, não existia à época da conjuração mineira.
Naquela época, havia no território correspondente ao Brasil de hoje, não um país, mas um território bastante extenso integrado ao Império português, chamado pelos historiadores atuais de América portuguesa. Apesar de sua contiguidade geográfica, o território era naquele momen­to, composto de inúmeras províncias coloniais, que possuíam pouca ou nenhuma integração física, econômica e cultural/identitária. Dizia-se que, àquela época, era mais fácil viajar de Salvador a Lisboa do que de Salvador ao Rio de Janeiro.
Da mesma forma, o comércio entre as capitanias do norte e as do sul era bastante reduzido, bem como as trocas culturais entre elas.
Certamente, um habitante da região mineradora ao final do século XVIII não se sen­tiria pertencente à mesma nação de um pernambucano da mesma época.
Ainda não havia, portanto, uma identidade nacional constituída, que estivesse traduzida na existência de vínculos identitários entre os habitantes da então América portuguesa.
Alguém nascido em Pernambuco sentia-se pernambucano e não brasileiro, da mes­ma forma que uma pessoa nascida na Bahia via-se apenas como baiano.
Entre a população nativa das regiões coloniais portuguesas, o sen­timento de identidade era local, não nacional. Portanto, se no século XVIII e mesmo no início do XIX não havia um país chamado Brasil, bem como não havia uma identidade nacional constituída, como seria pos­sível que os conjurados mineiros houvessem lutado pela libertação da nação brasileira?
Estudos mais recentes, como o do historiador Kenneth Maxwell, têm apontado como causa imediata para o início do movimento as disputas por poder político e por privilégios econômicos entre as elites da próspe­ra Vila Rica, no coração da região mineradora.
Segundo o autor, durante a Era Pombalina (1750-1777), o Marquês de Pombal adotou uma série de medidas modernizadoras visando tor­nar a arrecadação de fundos portuguesa mais eficiente. A consequência desse processo para a América portuguesa, que já era, naquela época, a parte mais rica do Império português, foi um aumento brutal do contro­le e da pressão portuguesas sobre as regiões coloniais, sobretudo as da região das minas, provocando insatisfação entre as elites.
No entanto, com o fim da administração pombalina, houve nova­mente um afrouxamento desse controle, possibilitando que as elites locais retomassem o estrito controle político e econômico da região. Na prática, o grupo voltou a se beneficiar das concessões para extração de minérios e da “vista grossa” feita pelo governador ao intenso contraban­do de ouro e diamantes praticado pelo grupo ou em seu benefício.
No ano de 1785, essa situação se modificou, com a nomeação de Luís da Cunha Meneses como novo governador. Meneses entrou em conflito com a elite local, pois privilegiava seus apadrinhados e desrespeitava as autoridades e a legislação vigente.
Os conhecidos poetas arcadistas Tomás Antônio Gonzaga, ouvidor da região, e Claudio Manuel da Costa, poderoso advogado detentor de concessões para a extração de minérios, tiveram os seus interesses atin­gidos pela chegada do novo governador.
De acordo com Maxwell: “O lucrativo controle do contrabando pelos lacaios do go­vernador, tanto no Distrito Diamantino quanto em Santo Antônio, eliminou do negó­cio muitos dos que dele se beneficiavam antes.”
A fama do novo governa­dor de beneficiar militares de origem portuguesa em de­trimento dos oficiais nativos também gerava descontenta­mento no grupo dos Dragões Reais das Minas, do qual fa­zia parte o alferes Joaquim da Silva Xavier, o Tiradentes.
Portanto, foram prin­cipalmente os conflitos de interesse, as tensões e as disputas em torno do poder local, agravadas pelo retorno da fiscalização metropolitana em um período de decadência na produção de ouro, que levaram os conjurados a planejarem para o dia da Derrama uma rebelião separatista, cujo objetivo era libertar a região das minas do controle impe­rial, iniciando a partir dali uma experiência de autogoverno. Desse modo, não houve qualquer pretensão de independência nacional no movimento dos conjurados mineiros.
Certamente, a difusão do ideário liberal pela região, possibilitada pelo costume das elites de completar seus estudos na Europa, contribuiu para intensificar as reflexões do grupo, bem como para fortalecer suas convic­ções separatistas. Além disso, a experiência bem-sucedida das 13 colônias norte-americanas, que tinham conseguido a libertação do jugo colonial britânico, também serviu de inspiração para os revoltosos do sul.
Ainda, de acordo com Kenneth Maxwell: “O alferes Silva Xavier estava tão indignado com a parcialidade do governador em relação a seus favoritos que falava abertamente em rebelião”.
Como é sabido, o plano foi descoberto antes de ser concretizado e Joaquim José da Silva Xavier, o conjurado de origem social mais modesta, foi punido exemplarmente, com a decretação da sua prisão e morte, por enforcamento, no ano de 1792.
Seus companheiros de conjura, ao contrário de Tiradentes, foram submetidos a pro­cesso, mas poupados da morte pela Coroa. Terminava, assim, de forma melancólica, o sonho de liberdade e de autonomia dos homens ilustrados de Vila Rica.
A Conjuração Baiana (1798), também chamada de Conjuração dos Alfaiates, ocorreu alguns anos mais tarde, e teve motivações e a partici­pação de grupos sociais distintos dos da região de Vila Rica.
Sede político-administrativa da América portuguesa até o ano de 1763, Salvador era uma cidade de grande importância para o Império português.
Por conta de sua importância política ao longo dos séculos de coloni­zação portuguesa nas Américas, a cidade de Salvador ainda concentrava um grande volume de transações comerciais com o mercado internacio­nal da época: boa parte do açúcar, do algodão e do tabaco exportados a partir da colônia tinha saída pelo porto da cidade.
Dessa forma, Salvador era uma cidade multifacetada, em que os di­versos grupos sociais possuíam representação expressiva. Se, por um lado, encontramos mercadores enriquecidos com o lucrativo comércio internacional, por outro, possuía também um grande número de escra­vos e de homens livres e pobres, que encontravam poucas possibilida­des de inserção social em uma sociedade ainda pautada pelos valores do Antigo Regime.
Como vimos, as práticas e os valores característicos das sociedades europeias ante­riores à Revolução Francesa foram nomeadas de Antigo Regime. Mas, se essas são características dos países europeus da época, por que afirmamos que os valores do Antigo Regime estavam presentes na cidade de Salvador do século XVIII?
Para compreender essa questão, é necessário perceber a América portuguesa não como uma região em separado, isolada do contexto europeu, mas como parte integrante do Império português, cuja sede estava localizada na Europa, e que, portanto, compartilhava dos valores comuns às demais sociedades europeias do período.
Na colônia, assim como na metrópole, havia restrições à participação política daqueles que tivessem “defeito mecânico” ou que não atestas­sem sua “pureza de sangue”.
Do mesmo modo, e pelos mesmos motivos expostos anteriormente, a origem social de cada um não era algo pessoal, mas uma questão de interesse público. Nesse contexto, aqueles que, em sua genealogia fa­miliar, apresentassem vínculos sanguíneos com cristãos-novos, índios, mouros ou negros estavam impedidos de participar da vida política na colônia, uma vez que esta era uma prerrogativa dos membros das famí­lias mais nobres da região.
Sobre esse assunto, o historiador Evaldo Cabral de Mello afirmou que: “Dos séculos XVI ao XVIII vigorava em Portugal, Espanha a respectivas colônias um sistema de discriminação que impedia aos descendentes de judeus, africanos, índios e mouros o acesso aos cargos públicos, à carreira eclesiástica, e às honrarias e mercês dispen­sadas pela Coroa. A honra do indivíduo e de sua parentela ficava assim prisioneira da pureza do sangue”.
Em uma sociedade marcada pela estratificação social como era a Sal­vador de fins de 1700, as possibilidades de ascensão das classes popu­lares eram muito remotas. Se a participação política na cidade era restrita à cha­mada nobreza da terra, a participação nas atividades comerciais locais também não dependia da livre ini­ciativa: somente à Coroa cabia a concessão de mono­pólios (direitos exclusivos) comerciais a pessoas ou a companhias de comércio.
Para a população mais pobre, apartada dos privilé­gios e das benesses concedidas pela Coroa aos seus favoritos, a piora em suas condições de vida gerada pelo aumento de preços das mercadorias era de responsabilidade da administração colonial, elitista e excludente.
Por todos esses motivos, o que a princípio era uma insatisfação popular ligada ao aumento de preços das mercadorias da cidade logo se converteu em um movimento muito maior, de crítica ao próprio colonialismo português.
O clima de insatisfação, acentuado pela grande circulação de ideias iluministas pela cidade (por meio de panfletos e da leitura pública das principais obras iluministas), levou à elaboração e à distribuição de panfletos criticando a monarquia absolutista e a administração colonial portuguesa, e defendendo ideias típicas do movimento iluminista francês, como a igualdade perante a lei e o livre comércio.
Ciente de tal movimentação, o governador da Bahia reagiu exigindo a abertura de uma investigação, cujos resultados apontaram a existência de um movimento de insatisfação popular que já programava a re­alização de um pronunciamento revolucionário. Motivado por essas informações, o governador orde­nou a prisão de 49 pessoas, acusa­ das de participarem da conspiração, das quais seis foram condenadas à morte e quatro levadas à forca.
A punição aos acusados de conjuração em Salvador foi consideravel­mente mais severa do que aquela imposta aos conjurados mineiros: na Bahia, ao contrário do ocorrido em Vila Rica, a participação da popula­ção no movimento foi ampla e diversificada: havia entre os descontentes desde proprietários de terra até soldados e alfaiates, que muitas vezes eram negros ou pardos.
Tudo isso, aliado ao medo de que na América portuguesa se repetisse o que tinha acabado de ocorrer no Haiti, onde, no ano de 1792, escravos e ex-escravos lideraram uma bem-sucedida revolução social, provocou uma reação mais rigorosa e violenta da Coroa. O chamado haitianismo já tirava o sono da elite colonial.
Todos os condenados eram de origem social modesta e de cor negra ou parda.

A transferência da Corte portuguesa para as Américas, ou o início do processo de “interio­rização da metrópole”
Desde fins do século XVIII eclodiram rebeliões em diversas regiões co­loniais questionando alguns dos pressupostos da colonização portu­guesa, como a cobrança de impostos e a ausência de perspectivas para a população mais pobre. Em muitos casos, como em Vila Rica e Salvador, houve forte presença das ideias liberais nos movimentos contestatórios.
A defesa de governos constitucionais, das liberdades individuais e da separação entre Estado e Igreja são apenas alguns desses princípios, presentes desde meados do século XVIII no pensamento iluminista e fortalecidos com a Revolução Francesa, que abalou as estruturas do Antigo Regime europeu e produziu um dos maiores mitos históricos de todos os tempos: Napoleão Bonaparte.
Mesmo nos países europeus não afetados pela expansão do impé­rio napoleônico, esse processo era visto como temerário, pois havia a preocupação de que a influência trazida pelos conquistadores franceses pudesse afetar as estruturas do Antigo Regime no restante da Europa. Se Bonaparte lutou ao lado dos revolucionários na França e participou da derrubada do absolutismo em seu país, poderia fazer o mesmo nos países vizinhos.
O Bloqueio Continental, decretado por Napoleão Bonaparte, em 1806, proibia todas as nações europeias de fazer co­mércio com a Inglaterra. Caso essa deter­minação não fosse cumprida, o imperador francês prometia invadir com seus exér­citos e ocupar os países desobedientes. Com essa medida, Napoleão pretendia enfraquecer a indústria inglesa, maior obstáculo ao desenvolvimento industrial da França. Napoleão pretendia utilizar sua força militar para inibir o comércio dos pa­íses europeus com a Inglaterra e, assim, fortalecer a economia francesa.
E foi exatamente isso o que aconteceu: à medida que as tropas na­poleônicas circulavam pelo continente, levavam consigo os ideais da Revolução Francesa, contribuindo para ampliar a circulação das ideias liberais em toda a região.
É importante ressaltar, no entanto, que apesar de se considerarem os porta-vozes dos princípios liberais, os franceses, em seu movimento de expansão pela Europa, agiram de forma violenta, intolerante e desres­peitosa em relação à população conquistada.
O expansionismo francês não foi, portanto, algo benéfico à popu­lação conquistada, como se poderia imaginar: como todo processo de conquista, ele acarretou em prejuízos irreparáveis aos países que foram objeto do desejo e da ambição desmedidas de Napoleão.
Apesar da incontestável superioridade militar do exército napoleô­nico, que lhe rendeu a conquista de novos territórios, faltava ao impera­dor francês superar militar e economicamente a Grã-Bretanha, o único país a já ter passado pela Revolução Industrial, e que apresentava uma estrutura econômica mais sólida e pujante que a de seu rival. Planejan­do converter sua força militar em ganhos econômicos concretos para o país, Bonaparte decretou, em 1806, o chamado Bloqueio Continental.
Portugal, que mantinha fortes relações econômicas com a Inglaterra, não podia aderir ao bloqueio de Napoleão. Ao mesmo tempo, não podia recusá-lo, pois seu país poderia ser invadido pelas tropas francesas. Ameaçado por ingleses e franceses, a situação do príncipe-regente português era delicada.
Conselheiro do príncipe, o nobre D. Rodrigo de Sousa Coutinho tinha uma solução: transferir a Corte portuguesa para as Américas, que já era naquela época a parte mais rica do Império, e, no Brasil, recuperar o prestígio e a prosperidade que um dia o Império por­tuguês possuiu. Pressionado pelos ingleses, que já haviam aportado no litoral de Lisboa à espera de uma decisão da Coroa portuguesa, e ciente de que o exército de Napoleão deixara a França em direção ao seu país, o príncipe resolveu aceitar a sugestão de seu ministro.
Por isso, em 27 de Novembro de 1807, acompanhado de aproximadamente 15 mil pessoas, o príncipe dei­xa o porto de Lisboa rumo à parte americana de seu Império: o Brasil, ou a América portuguesa, evitando a perda de seu trono e, ao mesmo tempo, reconstruindo, a partir das Américas, um império grandioso como foi o Portugal cantado por Camões, em seu famoso poema “Os Lusíadas”.
O trajeto das embarcações portuguesas rumo ao Brasil durou cerca de dois meses. Escoltada pela marinha inglesa, a mais poderosa do mundo, a família real chegou a Salvador no dia 22 de janeiro de 1808, e foi recebida com festa pela população local.
Já em terras americanas, o príncipe João assinou um de­creto de enorme importância para todo o Império português: o da abertura dos portos às nações amigas. Segundo esse do­cumento legal, passava a ser possível, a partir daquele mo­mento, a realização de transações comerciais entre a América portuguesa e as nações estrangeiras, sem a necessidade de intermediação de Lisboa.
Com esse documento chegava ao fim, na prática, o pacto colonial, e, consequentemente, o status de colônia da Amé­rica portuguesa, ou pelo menos de uma parte dela: a região Centro-Sul, onde a Corte por­tuguesa se instalou. É a partir daí que tem início um processo chamado pela historiadora Maria Odila Leite da Silva Dias de “interiorização da metrópole”.
Segundo a referida historiadora, a vinda da família real para o Rio de Janeiro, até então sede político-administrativa da colônia portuguesa nas Américas, provocou um processo de deslocamento da metrópole de Lisboa para o Rio de Janeiro. Dali em diante, era a partir dessa cidade que o Império portu­guês seria comandado.
O Rio de Janeiro passava, afinal, de cidade colonial à cidade impe­rial, provocando um profundo des­contentamento nas outras regiões coloniais da América portuguesa e mesmo em Lisboa, que perdia a partir de então, pelo menos de for­ma provisória, seu status de sede do Império português.
Por outro lado, esse processo de interiorização da metrópole garantiu aos portugueses americanos que habitavam a cidade do Rio de Janeiro uma ampliação de oportunidades sem precedentes.
Novas funções e instituições foram criadas, permitindo a alguns des­ses homens a incorporação em postos burocráticos ligados a essa nova realidade vivida pela cidade: bancos, bibliotecas, escolas militares e de medicina foram fundadas; novas oportunidades de comércio interno e externo surgiram em decorrência desse processo, e tudo isso provocou o enraizamento de novos interesses, ligados aos grupos beneficiados com a vinda da Corte portuguesa para o Rio de Janeiro.
Além desses casos, há também o dos portugueses natos que migram com o rei português para o Brasil e aqui recebem benefícios, terras e privilégios, consolidando seus interesses no Centro-Sul da América por­tuguesa. Será esse grupo que fará forte oposição ao retorno da Corte a Portugal, alguns anos mais tarde.
Não é possível afirmar que a vinda da Corte portuguesa para as Américas significou, na prática, o fim do status de colônia para todo o Brasil. Como discutimos anterior­mente, não havia ainda, naquele momento, o Brasil enquanto um país com unidade política e identidade nacional constituídas.
O que havia àquela época era um território chamado Brasil, composto por inúmeras regi­ões coloniais com pouca ou nenhuma integração física e econômica, e cuja população na­tiva cultivava muito mais um sentimento de identidade local do que de identidade nacional.
Por isso, o processo de construção da nação brasileira, bem como de sua nacionalidade, teria início após a separação política entre o Brasil e o Império português e estaria consolidado apenas em meados do século XIX. Desse modo, para melhor compreendermos essa história, é neces­sário perceber que a constituição do Brasil enquanto um país politica­mente independente de Portugal e a constituição de uma nacionalidade brasileira ocorreram em momentos diferentes.
Assim, o processo de emancipação política do Brasil foi motivado, portanto, não por arroubos de nacionalismo dos brasileiros descontentes com os colonizadores por­tugueses, mas por insatisfações e dissidências internas do Império português, que abarcava interesses contraditórios e irreconciliáveis.
A impossibilidade dessas diferentes partes em conflito chegarem a um acordo levou à opção pela independência, como veremos adiante.
Resumindo. Vale a pena reforçar, a independência do Brasil não resultou de uma guerra entre diferentes nações, mas, sim, de uma guerra ocorrida no interior da na­ção portuguesa, como afirma o historiador Sérgio Buarque de Holanda, que nomeou todo o processo de “Guerra civil portuguesa”.
Compreendida essa questão, pode-se entender melhor por que a vinda da Corte para o Rio de Janeiro não trouxe benefícios nem foi bem aceita por todas as regiões da então América portuguesa.
Exemplo: Para as províncias do norte, por exemplo, esse processo de interiorização da metrópole provocou uma aproximação incômoda entre a região e o centro decisório de todo o Império: na prática, a metrópole inte­riorizada estava mais próxima de suas colônias e, assim, podia controlá-las com mais eficiência.
Nos anos de permanência da Corte portuguesa no Rio de Janeiro, houve um aumento significativo dos impostos cobrados às províncias do norte.
Essa sobrecarga de impostos recaídos sobre a região, aliada ao novo status político-ad­ministrativo do Rio de Janeiro, gerou um profundo descontentamento entre as elites locais.
A Revolução Federalista de 1817 deixava claro o desejo dos pernambucanos de maior au­tonomia em relação à metrópole. Inspirados pelo modelo federalis­ta norte-americano, os revoltosos pernambucanos reivindicavam o direito ao exercício do autogover­no, mantendo-se parte do Impé­rio português, mas assegurando sua autonomia local. O movimen­to foi sufocado pelas pretensões centralizadoras de D. João VI, mas deixava clara a inexistência de unidade entre as diferentes regiões da América portuguesa.
Esse quadro de insatisfações e dissidências no interior do Império português foi agravado quando, em 1820, estourou em Portugal um movimento reivindicatório que ficou conhecido como a Revolução do Porto.

A Revolução do Porto e a emancipação da América portuguesa

Você já se perguntou alguma vez como ficou a situação de Portugal após a transmigração da família real para a América portuguesa? Uma das formas de tentarmos responder a essa pergunta é observando Lis­boa, a antiga sede do Império português.
Após a partida da Corte portuguesa para o Rio de Janeiro, a cidade transformou-se no re­trato da destruição: invadida e arrasada pela guerra com as tropas napoleônicas, governada por um militar inglês, prejudicada pelo deslocamento do eixo econômico do império para o Rio de Janeiro, a situação de Lisboa e do restante de Portugal era caótica.
No ano de 1814, após cerca de seis anos de conflitos e graças a um grande esforço do povo português, as tropas napoleônicas deslocadas para o país foram finalmente derrotadas. Mas o saldo de destruição e de prejuízos de toda ordem deixado por esses anos de guerra era desanimador. A perspectiva lisboeta de retomada do protagonismo no interior do Império português sofreu um duro golpe com a elevação do Brasil a reino unido de Portugal e Algar­ve (1815): com essa medida, ficava clara a intenção da monarquia portuguesa de dar conti­nuidade ao projeto de enraizamento da metrópole em terras americanas, contrariando os interesses dos portugueses que viviam na Europa.
Resumindo: Como já foi dito, estava em curso no Brasil não apenas uma estada temporária da Corte, circunscrita ao momento em que Portugal estivesse invadido por tropas francesas, mas a execução de um projeto de refundação do Império português a partir das Américas. Transferir-se para o Brasil não foi apenas uma forma de fugir de Napoleão, mas também uma tentativa do Império português de recuperar o esplendor, deslocando a sua sede para a região que já era há muito tempo a mais rica de todo o império: o Brasil.
Em 1820, o descontentamento em relação à situação periférica de Portugal no Império português acentuou-se: na Espanha, um movimento de inspiração liberal ganhava as ruas e submetia o rei a uma constituição.
No mesmo ano, o atraso no pagamento das tropas portuguesas sediadas no Porto foi o estopim para o início de uma revolta que ganhou as ruas da cidade e, em poucos meses, se es­tendia a Lisboa, ganhando o nome de Revolução Liberal do Porto: assim como os espanhóis, os portugueses pretendiam não apenas que o rei retornasse a Portugal, mas também que ele assinasse uma constituição, que limitaria seus poderes e garantiria direitos aos portugueses.
Além de desejarem retomar a condição de sede do Império português, o que seria con­seguido caso o rei D. João VI retornasse a Lisboa, os revolucionários tinham outras exigên­cias: para satisfazer aos desejos das Cortes de Lisboa, convocadas com o objetivo de reunir os diferentes representantes da nação portuguesa e, assim, dar continuidade ao movimen­to revolucionário, era necessário que o rei tomasse medidas que, na prática, significariam o fim do processo de “interiorização da metrópole” no Centro-Sul da América portuguesa.
A esse processo, os brasileiros reagiram, denunciando o que seria uma tentativa de reco­lonização do Brasil por parte das Cortes de Lisboa. Na prática, como já vimos, a única região “descolonizada” da América portuguesa, que fazia às vezes de metrópole e impunha um rígi­do controle sobre as demais regiões, era a Centro-Sul, liderado pelo Rio de Janeiro, que a essa altura já era chamado nas províncias do norte pejorativamente de “a nova Lisboa”.
De fato, o Rio de Janeiro e os grupos de interesses constituídos na cidade após a chega­da da família real corriam risco de sofrer sérios prejuízos em consequência das determina­ções que vinham das Cortes.
A partir daí, as divisões entre os grupos favoráveis e os contrários aos revolucionários do Porto irão se tornar cada vez mais evidentes, até o momento em que reste apenas a alterna­tiva da separação política entre os reinos.
Mas antes de chegar a isso, vamos discutir outros aspectos importantes dessa história?
Anteriormente, afirmamos que o movimento de reação às determinações vindas das Cortes de Lisboa foi liderado pelos brasileiros, que denunciaram a tentativa de recolonização do Brasil contida naquelas medi­das. Mas, se antes da independência não havia o Brasil enquanto um país constituído, e se tampouco havia naquele momento uma nação brasileira, como é possível afirmar que os brasileiros tiveram um papel de destaque na oposição às determinações de Lisboa?
O significado do termo brasileiro é hoje para nós bastante conhecido: todos o identifica­mos como o termo referente àqueles que possuem nacionalidade brasileira, ou seja, nasce­ram no país ou são descendentes de brasileiros. No passado, entretanto, o termo brasileiro já teve diferentes significados: no século XIX, precisamente durante a Revolução do Porto, ser brasileiro era assumir uma atitude política.
Assim, brasileiros eram não necessariamente as pessoas nascidas no território que em alguns anos formaria um novo país, o Brasil, mas, sim, aqueles que estavam unidos, ainda que momentaneamente, em torno das mesmas convicções: eram contrários às determina­ções que chegavam às Américas por meio das Cortes de Lisboa.
Para os homens ligados ao Partido Brasileiro, não inte­ressava o retorno da Corte portuguesa para Lisboa, pois isso significaria a perda de privilégios adquiridos com o deslocamento do eixo do Império português para o Rio de Janeiro. Apesar disso, a separação política entre os reinos do Brasil e de Portugal não foi algo planejado pelo grupo dos brasileiros desde o início das divergências en­tre eles e as Cortes portuguesas.
Na verdade, ela foi uma solução surgida e amadu­recida no curso dos acontecimentos, à medida que ia ficando clara a impossibilidade de brasileiros e por­tugueses chegarem a um consenso. No primeiro momento, os brasileiros defenderam a criação de um império dual, o Império luso-brasileiro, com duas sedes, o reino do Brasil e o reino de Portugal.
Ambos os reinos estariam articulados politi­camente um ao outro, garantindo a autonomia de ambos e resguardando os interesses constituídos na cidade do Rio de Janeiro de qualquer medida que pudesse alterar a sua condição.
Diante do aumento das pressões vindas de Lisboa e de dentro da própria colônia, D. João VI, até então reagindo ao movimento com medidas conciliadoras, se viu obrigado a tomar uma decisão: pressionado pelas tropas portuguesas, que manifestavam sua insa­tisfação nas províncias do Grão-Pará e da Bahia, o rei jurou obedecer à constituição que estava sendo elaborada em Portugal, e decidiu-se pelo retorno ao continente europeu.
A possibilidade de “recolonização do Brasil” era a grande preocupação do grupo.
No dia 26 de abril de 1821, D. João VI finalmente regressou a Portugal, atendendo ao pedido das Cortes e causando descontentamento entre os brasileiros, que chegaram a tentar impedir a sua saída pelo porto da Guanabara. Constatada a inevitabilidade do retorno do rei, alguns componentes do Partido Brasileiro pas­saram a defender a ideia da separação entre os reinos, como forma de assegurar a autonomia da região Centro-sul da América portuguesa em relação ao Império português.
Ciente da insatisfação que seria causada pela sua decisão, e pretendendo evitar a eclo­são de um movimento que significasse o fim do controle da dinastia dos Bragança sobre o território português nas Américas, o rei português se decidiu pela permanência de seu filho primogênito, o príncipe Pedro, no Brasil, até que se resolvessem as divergências entre o movimento em curso na cidade de Lisboa e aqueles que se opunham a ele, localizados, sobretudo, no Rio de Janeiro.
Entretanto, a permanência no Brasil de um herdeiro do trono português desagradou as Cortes portuguesas, que imediatamente passaram a exigir a volta de Pedro para Portugal. O Partido Brasileiro, por sua vez, iniciou um movimento para convencer Pedro a ficar.
A disputa entre as Cortes e o Partido Brasileiro teve momentos decisivos. Em 9 de janeiro de 1822, o príncipe Pedro recebeu um manifesto com mais de 8 mil assinaturas pedindo que ele ficasse no Brasil e concordou em ficar. O episódio é conhecido como o Dia do Fico.
As Cortes portuguesas continuaram tomando medidas e fazendo exigências que contrastavam com os interesses enraizados na região Centro-Sul do Brasil. Os interes­ses de brasileiros e portugueses tornavam-se cada vez mais conflitantes, e a separação entre os reinos parecia ser a única forma de garantir a autonomia do Centro-Sul e, por extensão, de toda a América portuguesa, diante da insistência das Cortes em retomar o controle estreito sobre essa região.
Para a família real portuguesa, uma vez que a separação entre os dois reinos parecia inevitável, seria mais vantajoso que ela acontecesse sob a liderança de um representante da família real portuguesa, pois assim estaria garantido para a dinastia portuguesa o controle das duas regiões, ainda que, do ponto de vista político, a independência do Brasil signifi­casse a separação dessa região de Portugal.
Desse modo, a liderança de Pedro no processo de independência do Brasil não repre­sentou uma ruptura ou um rompimento de seus laços com a família Bragança. Muito pelo contrário: ela representou a possibilidade de manutenção dos laços entre Brasil e Portugal, apesar da iminência da separação entre as partes, que se efetivaria ainda no ano de 1822.
É importante, ainda, relembrar que nem todas as regiões coloniais manifestaram descontentamento ou oposição às decisões vindas de Lisboa: nas províncias do norte, contrariadas e sufocadas com o controle da “nova Lisboa” sobre sua região, a revolução iniciada em Portugal reacendia a chama do autogoverno, pois talvez possibilitasse a esses locais a conquista de maior autonomia tanto em relação a Portugal quanto em relação ao Centro-Sul do Brasil. Em muitos casos, houve manifestações explícitas de apoio aos revol­tosos nas regiões ao norte da América portuguesa.
Por isso, é importante frisar novamente que não é possível compreender o processo de independência do Brasil da forma como geralmente estamos acostumados a estudá-lo: como um movimento uniforme, unindo todos aqueles nascidos no Brasil e chamados de brasileiros, contra a opressão do colonizador.
Entretanto, o caminho rumo à construção de um país integrado e com unidade política, abarcando todo o território que um dia perten­ceu ao Império português era, naquele momento, apenas um dos inúmeros caminhos possíveis de serem trilhados e estava em seu estágio inicial.
Começava, a partir de então, o longo e duro processo de construção do Brasil.

RESUMO DO CAPÍTULO

Vimos nesse capítulo que, em meados do século XVIII, no contexto de crise do Antigo Regime europeu, multiplicaram-se pela América portuguesa movimentos de insatisfação em relação ao excessivo controle e/ou à cobrança de impostos vindas da metrópole. Dois dos movimentos mais conhecidos da época foram: a conjuração mineira e a conjuração baiana.
Vimos também que não é possível afirmar que esses movimentos tiveram alcance nacional ou pretendiam lutar pela independência nacional, pois a nação e a nacionalidade brasileira não estavam constituídas até meados do século XIX.
Por fim, vimos que as repercussões da Revolução Francesa e a difusão do ideário liberal pelo continente europeu tiveram seus efeitos também no continente americano: elas serviram de inspiração para os movi­mentos contestatórios citados acima e estiveram indiretamente ligados a uma grande mudança ocorrida na Amé­rica portuguesa: a transferência da Corte portuguesa para a parte americana de seu império. Pressionados pelos ingleses e por Napoleão, o príncipe regente português se decidiu pela transferência da sede do império português para as Américas, em um processo que ficou conhecido como a “interiorização da metrópole”.
Os conflitos ligados à independência e à formação do Brasil não foram motivados por critérios de nacionalidade, mas por disputas no interior do Império, entre aqueles que se sentiam prejudicados e os que haviam obtido bene­fícios com a mudança no status da cidade do Rio de Janeiro. Dessas disputas internas surgiria, em 1822, o Brasil.

ATIVIDADE DO CAPÍTULO II (ENVOLVENDO AS QUESTÕES 3 E 5)

Leia os fragmentos de textos destacados abaixo e assinale as alternativas corretas:
“A permanência da família real no Brasil era desejada por aqueles setores sociais — comerciantes, burocra­tas, proprietários de terras e de escravos — que prosperavam, acumulavam poder e ganhavam prestígio no Rio de Janeiro. Eles sabiam que os favores concedidos pelo soberano português eram a razão fundamental das mudanças que ocorriam em suas vidas.”
(MATTOS, I. R. Independência ou Morte: a emancipação política do Brasil. São Paulo: Atual, 1991).
“Novas instituições foram criadas pela Coroa portuguesa, e a maioria delas foi estabelecida no Rio de Janeiro, que, assim, assumiu um papel centralizador dentro de uma América portuguesa que antes era muito fragmentada no sentido administrativo. Houve resistência a isso, principalmente em Pernambuco, em 1817. Mas, no final, o poder central foi mantido.”
(Adaptado de Kenneth Maxwell, "Para Maxwell, país não permite leituras convencionais". Entrevista concedida a Marcos Strecker. Folha de São Paulo, 25/11/2007, Mais, p. 5).

Questão 1
Sobre as transformações político-sociais e econômicas ocorridas durante a permanência da Corte portugue­sa no Brasil (1808-1821), estão corretas as afirmações a seguir, À EXCEÇÃO DE:
a) A vinda da família real para o Brasil manteve a região Centro-Sul colônia em uma posição periférica com relação às decisões políticas e econômicas do Império português, permanecendo a cidade de Lisboa como o principal centro econômico e político do Império.
b) A abertura dos portos favoreceu os interesses dos proprietários rurais produtores de açúcar e algodão, uma vez que se viram livres do monopólio comercial.
c) Durante o Período Joanino, organizaram-se novos órgãos e instituições, como o Banco do Brasil e a Casa da Moeda.
d) Dentre as medidas que mudaram o perfil político-econômico da colônia, destacou-se o decreto que promoveu a Abertura dos portos às nações amigas, em 1808, que concedeu à América portuguesa a per­missão para a realização de comércio com as nações amigas do Império português.

Questão 2
No ano de 1817, ocorreu em Pernambuco um movimento revolucionário, que contou com a participação das mais diversas camadas sociais. Esse movimento ficou conhecido como Revolução Pernambucana. Dentre os fatores que contribuíram para a eclosão da Revolução Pernambucana é INCORRETO citar:
a) A insatisfação com os portugueses que controlavam o comércio na região.
b) A excessiva cobrança de impostos do governo sobre a população de Pernambuco.
c) A influência dos ideais da Revolução Francesa no movimento pernambucano.
d) A insatisfação com a manutenção da escravidão, que causava desigualdade na colônia.
Questão 3
“Quer Portugal livre ser,
Em ferros quer o Brasil;
promove a guerra civil,
Rompe os laços da união.”
(Volantim, 7/10/1822)
A partir dos versos acima, publicados em um jornal fluminense, pode-se verificar que a postura de Portugal em relação a sua antiga colônia, ao longo do ano de 1822, aprofundou o desgaste das relações entre os dois reinos.
Assim, a independência do Brasil pode ser explicada pelo seguinte fato:
a) criação do cargo de governador das Armas, gerando conflitos institucionais no Exército nacional.
b) arbitrariedade das Cortes portuguesas, subordinando os governos provinciais diretamente a Lisboa, e tomando medidas que foram interpretadas como uma tentativa de recolonização das Américas, que desa­gradavam ao grupo dos brasileiros.
c) existência de facção separatista brasileira ligada ao tráfico negreiro, objetivando controlar as posses­sões portuguesas na África.
d) revogação da liberdade de culto concedida aos britânicos, ampliando os antagonismos entre Londres e as Cortes portuguesas.



CAPÍTULO III
“Sois reis! Sois reis!” A construção do Brasil imperial
De Reino Unido a Império do Brasil
A Constituição de 1824 e suas repercussões
A crise do Primeiro Reinado
O Segundo Reinado
O regresso conservador e a antecipação da maioridade de D. Pedro
Crise e fim do Império do Brasil (1870-1889)
(ENVOLVE AS QUESTÕES 3, 4 E 5)

A frase de abertura, do naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire, já foi utilizada em outro capítulo para embasar a discussão sobre o pro­cesso de independência da América Portuguesa entre os anos de 1808 e 1822. Para compreendermos o período histórico do pós-independência em toda a sua complexidade, é necessário recorrer novamente a ela: a ruptura de D. Pedro com as Cortes portuguesas resultou na criação de um novo país, o Brasil.
É importante relembrar que o movimento de insatisfação em rela­ção às decisões das cortes portuguesas, que resultou na separação polí­tica entre os reinos do Brasil e de Portugal, foi protagonizado pelo grupo integrante do chamado Partido Brasileiro.
Por esse motivo, a maioria dos integrantes desse grupo vivia na região Centro-Sul, nas proximidades da cidade do Rio de Janeiro. Desse modo, o processo de independência foi conduzido pelas lideranças do Centro-Sul e obedeceu aos interesses específicos desse grupo e dessa região.
Já frisamos que não houve um movimento nacional de independência, pois não havia unidade e tampouco havia interesses comuns entre as diferentes regiões que compunham a parte americana do Império português até o ano de 1822. O único elo entre essas diferentes regiões era o fato de todas serem parte de um mesmo todo — o Império Português.
Com a condução vitoriosa do processo de independência a partir do Centro-Sul, rompeu-se a ligação entre as partes: herdeiro de um nome, Brasil, e de um território, aquele que um dia pertenceu ao Império por­tuguês, ou seja, a América Portuguesa, D. Pedro I tentaria, a partir de então, reconstituir essa ligação, conferindo a ela um novo significado.
Um aspecto importante relativo ao momento pós-independência é que, uma vez que não havia entre as regiões coloniais da América Portuguesa um sentido de unidade política, cultural ou histórica preexistente à independência do Brasil, havia uma grande possibilida­de de que aquele território que por três séculos pertencera a Portugal se fragmentasse após a separação de sua antiga metrópole.
Da mesma forma como ocorreu na América Espanhola, em que os antigos vice-reinados foram transfor­mados em países independentes ao longo do século XIX, a América Portuguesa poderia ter dado lugar a diferentes países independentes entre si. Por que isso não ocorreu no Brasil? Essa é uma pergunta para a qual muitos historiadores têm buscado uma resposta.
Uma das respostas possíveis para essa pergunta está associada à atuação de dois homens proeminentes nesse começo de século: D. Pedro I e José Bonifácio. Estes puseram em prática, nos primei­ros anos de governo imperial, um projeto de constru­ção de um novo vínculo entre essas regiões, a partir do Centro-Sul do Brasil, e não mais a partir de Lisboa.
Iniciava-se naqueles anos a formação do Império do Brasil.
Nesse processo de construção de uma nova unidade política entre as regiões da antiga América Portuguesa, houve grande resistência. Como já foi estudado, nem todas as regiões coloniais pretendiam romper com o Império Português e incorporar-se ao novo país em gestação naquele momento. Em regiões como a Bahia e o Grão-Pará, a incorporação ao Im­pério do Brasil foi feita por meio do recurso à força: tropas militares foram enviadas por D. Pedro para lutar contra os descontentes, favoráveis aos revolucionários do Porto.
Para alcançar o objetivo de transformar as desintegradas regiões que compuseram o Brasil colonial em um todo unificado que constituiria o Império do Brasil, seria necessário um go­verno forte e centralizador, capaz de impor a sua autoridade às regiões descontentes do novo império. Assim pensava José Bonifácio de Andrada, um dos principais conselheiros do rei.
Desse modo, durante todo o período de governo de D. Pedro, chamado de Primeiro Reinado, políticas centralizadoras foram adotadas pelo monarca com o objetivo de viabilizar a constru­ção de um país unificado, cujas fronteiras fossem correspondentes às da América Portuguesa.
Em primeiro lugar, é importante ressaltar que a oposição à política centralizadora de D. Pedro I não apareceu apenas nas regiões ao norte do Império que, desde o processo de independência, estiveram alinhadas ao Partido Português. Havia diferentes grupos em dis­puta, com projetos distintos de nação para o Brasil.
Nos momentos imediatamente após o processo de independência já era possível perce­ber a formação de grupos que discordavam quanto à forma política que o novo país deveria assumir. Entre todos eles, que vamos descrever melhor adiante, dois se destacavam: o gru­po encabeçado por José Bonifácio e o grupo liderado pelo jornalista Gonçalves Ledo.
O primeiro, capitaneado por José Bonifácio, defendeu a separação política entre os rei­nos do Brasil e de Portugal e a adoção da monarquia constitucional.
O outro grupo, liderado pelo jornalista Gonçalves Ledo, também se posicionara favorá­vel à separação entre os reinos à época da independência, e defendia a monarquia consti­tucional. Mas, se ambos concordavam nessas questões fundamentais, qual era o ponto de discordância entre esses dois grupos?
As diferenças entre esses dois grupos, um chamado de aristocratas e o outro de democra-tas, estavam ligadas à questão da distribuição de poderes entre o Executivo e o Legislativo, que poderiam dar ao governo de D. Pedro uma feição mais centralizadora ou uma feição mais descentralizada.
Mas antes de continuarmos nosso raciocínio, vamos compreender um pouco melhor essas ideias?
Aprendemos no capítulo anterior que um dos legados da Revolução Francesa foi a difusão das ideias liberais por todo o continente europeu. O movimento que pôs fim ao Antigo Regime na França e que defendia ideias como a igualdade perante a lei, a limitação do poder do rei por meio de uma constituição, a separação entre a Igreja e o Estado e a ga­rantia das liberdades individuais aos cidadãos serviu de inspiração a inúmeros movimentos semelhantes que ocorreram na Europa e até mesmo nas Américas ao longo do século XIX.
Os casos da Espanha e de Portugal são exemplos de quanto as ideias liberais cir­culavam pelo continente naqueles anos. De acordo com essas ideias, em governos constitucionais, as liberdades dos indivíduos seriam mais bem preservadas, pois os reis deveriam obedecer a uma Constituição, e, portanto, não teriam mais poderes ilimitados. Os cidadãos, por sua vez, teriam direitos iguais e estariam submetidos ao mesmo conjunto de regras, independentemente da origem social ou das preferên­cias pessoais do governante. Nesse formato, ricos e pobres, nobres e burgueses teriam os mesmos direitos perante a lei.
Outro princípio bastante valorizado era o da separação entre os poderes: difundido com base na obra do iluminista francês Montesquieu, ele atestava os benefícios da separação dos poderes em Executivo, Legislativo e Judiciário.
Os três poderes seriam independentes entre si e garantiriam a manuten­ção de um sistema de equilíbrio, em que não haveria excessos de nenhuma das partes. Ao rei caberia o comando do poder Executivo. Ele executaria a lei e os projetos aprovados pelo Legislativo.
Os representantes do povo, eleitos por meio do voto, comporiam o poder Legislativo, que seria exercido em um parlamento, uma assembleia, ou em órgãos como o senado e as câmaras de deputados. Aos integrantes do poder Legislativo caberia a elaboração e a votação das leis. O judiciário seria exerci­do por juízes e demais juristas, responsáveis pela aplicação da lei e pelo julga­mento daqueles que não as cumprissem.
Na prática, o equilíbrio entre os poderes variava de acordo com a correlação de forças de cada sociedade: quanto maior a soma de poder que cabia ao Executivo, mais cen­tralizado seria o governo. Ao contrário, se nesse equilíbrio de poderes prevalecesse o poder Legislativo, mais descentralizado seria o governo, maior seria a participação dos representantes do povo e mais autonomia teriam as regiões em relação ao poder central.
Como as ideias vinculadas ao grupo dos democratas contrariavam o projeto de nação defendido por homens fortes do governo, como José Bonifácio, e também contrariavam a própria vontade de D. Pedro, seus mem bros foram sendo isolados de uma efetiva participação política. Em 1823, quando se formou no Brasil uma Assembleia Constituinte com o objetivo de redigir a Constituição a ser jurada por D. Pedro I, os democratas não puderam participar desse processo.
Mesmo excluídos os democratas, as divergências persistiam quanto à for­ma que deveria assumir o governo do Brasil: entre os integrantes do Partido Brasileiro, que no futuro ficariam conhecidos como os liberais moderados, ainda era forte a defesa da prevalência do poder Legislativo no governo de D. Pedro. Assim, esse grupo era favorável a um governo mais descentralizado do que desejava o imperador, com maior participação do povo.
Os homens do povo possuíam plenas condições para o exercício de sua cidadania no Brasil do século XIX, ou seja, podiam participar da vida política do país, alguns apenas na condição de eleitores e outros como eleitores e pos­síveis candidatos aos cargos do Legislativo da época. Voltaremos a esse ponto quando analisarmos mais detidamente a Constituição de 1824.
Para melhor compreendermos as diferentes visões e posicionamentos políticos do período, vamos observar a tabela a seguir?

Partido Brasileiro durante o processo de independência

Formado por aqueles que se posicionaram contra a Revolução do Porto como aqueles que obtiveram benefícios com o deslocamen­to da sede do Império para o Rio de Janeiro. Os absolutistas, que eram contra a submissão do rei a uma Constituição, também integra­vam esse grupo naquele momento.

Partido Brasileiro após o processo de independência

Composto tanto por aqueles que defendem um modelo de monarquia constitucional com Executivo forte, como é o caso de José Bo­nifácio, quanto pelos que defendem um go­verno mais descentralizado, com mais peso para o poder Legislativo.

Partido Português durante o processo de independência


Do Partido Português faziam parte aque­les que se identificavam com a Revolução do Porto e, portanto, eram favoráveis ao retorno do rei a Portugal e às demais exi­gências dos revolucionários.

Partido Português após o processo de independência

Os portugueses que permaneceram no Brasil e não aderiram à independência, declarando-se brasileiros, os que defendiam a reunifica­ção entre os reinos do Brasil e de Portugal e ainda os absolutistas, que migraram para o Partido Português após a derrota da Revolu­ção do Porto em Portugal


Agora que já conseguimos identificar melhor as mudanças ocorridas nos partidos Português e Brasileiro após o processo de independência, vamos retomar o nosso raciocínio?
Resumo: Como já foi dito nas páginas anteriores, nem todos concordavam quanto à melhor forma de governo que o Brasil deveria adotar após a sua separação de Portugal: alguns, chamados de exaltados, defendiam a República, mas não eram muito nume­rosos e por isso não faziam tanto barulho.
Os absolutistas defendiam a forma de governo em que os poderes estão todos concentrados nas mãos do rei, e por isso eram contra a mo­narquia constitucional.
Entre os defensores da Constituição, também havia diferenças: os democratas eram favoráveis a um governo mais descentralizado, com predominância do poder Legislativo e acabaram perdendo espaço den­tro do Partido Brasileiro.
Já os aristocratas, liderados por José Bonifácio, eram favoráveis a um Executivo forte, um governo centralizado, que permitisse ao monarca brasileiro impor a sua autoridade e, assim, garantir a unidade do antigo território português nas Américas.
Para os adeptos dessas ideias, no processo de construção do Império do Brasil, era necessária a centralização do poder nas mãos do rei. Mas o que é um Império? Você conhece o significado dessa palavra? Você sa­beria diferenciar um império de um reino?
Quando analisamos os grandes impérios que existiram ao longo da história, percebemos que todos eles tinham algo em comum: a sua voca­ção expansionista. Todos promoveram, ao longo de sua existência, gran­des e bem-sucedidas expedições militares, conquistando novas terras e povos, e tornando-se muito poderosos.
Foi assim durante o Império Romano, no Império Português das grandes navega­ções, e em tantos outros exemplos. Mas se os impérios possuem essa característica, o que faria do Brasil recém-independente um Império, como sugere o seu nome?
De acordo com o historiador Ilmar Mattos, José Bonifácio e o grupo representado por ele, juntamente com D. Pedro, estavam diretamente envolvidos no processo de construção do Império do Brasil e para isso precisaram promover uma expansão diferente: no caso brasi­leiro, a expansão seria “para dentro” do território que um dia compôs a América Portuguesa. Desse modo, o Brasil do pós-independência não seria um império graças à conquista de terri­tórios vizinhos, como os da atual Argentina, Paraguai, Uruguai, entre outros exemplos.
O Brasil seria um império porque precisou expandir-se para dentro do antigo território português, conquistando e trazendo as regiões do Norte e do Sul, não identificadas desde o início com o projeto de nação pensado no Centro-Sul, para o seio desse novo país em construção: o Brasil. Era necessário, portanto, fortalecer o poder Executivo, para que o im­perador pudesse dispor de plenos poderes e, assim, colocar em prática o projeto idealizado por esse grupo: a construção do Império do Brasil.
Desse modo, o processo de construção do Império do Brasil e, por consequência, da nação brasileira, a “expansão para dentro”, tem início no governo de D. Pedro I e é possibi­litada pela ação centralizadora do imperador.
Para concluir a reflexão sobre os diferentes matizes do pensamento político no pós-independência, sugiro a observação atenta do significado das palavras aristocrata e democrata. É possível que já possa com­preender por que esses grupos foram nomeados dessa forma: os democratas foram os que defenderam, entre os grupos estudados, maior participação do povo na política, enquanto os aristocratas defendiam um governo mais restrito à participação popular.
Por esse motivo, como vimos, os democratas acabaram apartados de todo o processo de elaboração da Constituição. Entretanto, mesmo entre os ditos democratas, a defesa da de­mocracia não era tão evidente, pelo menos da forma como nós entendemos a democracia atualmente, pois em ambos os formatos a maioria esmagadora da população permanece­ria impossibilitada de qualquer tipo de participação política.
De toda a forma, as discussões e os desentendimentos entre os constituintes dificulta­vam o andamento da Assembleia. Como não se chegava a um acordo quanto à distribuição dos poderes entre o Executivo e o Legislativo, parecia cada vez mais difícil a tarefa de elabo­ração de uma Constituição para o país. Além do desagrado causado pelo interesse dos in­tegrantes do Partido Brasileiro na limitação dos poderes do rei, havia ainda outros motivos de desentendimentos, como a tentativa dos brasileiros de impedir que os portugueses que não declarassem apoio explícito à independência tivessem direitos políticos.

A Constituição de 1824 e suas repercussões

Diante dessa situação, em novembro de 1823, o Imperador Pedro I, em uma atitude carre­gada de autoritarismo, fecha a assembleia constituinte e nomeia um Conselho de Estado para ajudá-lo na elaboração de uma nova Constituição, sem a participação dos membros da Assembleia, diminuindo sua representatividade.
Tendo sido produzida pelo Imperador e pelos conselheiros escolhi­dos por ele, a Constituição foi outorgada em 1824. Você sabe a diferença entre as palavras promulgada e outorgada?
Quando uma carta constitucional é elaborada por representantes do povo eleitos para o exercício do poder Legislativo que lhes compete e o governante apenas a assina, comprometendo-se a obedecê-la e, ao mes­mo tempo, aprovando-a, dizemos que a Constituição foi promulgada.
Quando, no lugar, a Carta é imposta ao povo de forma autoritária, sem que seus representantes tenham participado de sua elaboração, di­zemos que a Constituição foi outorgada.
E foi assim que ocorreu com a Constituição de 1824: elaborada sem a participação dos constituintes, ela foi recebida com desagrado por boa parte dos cidadãos e súditos desse império em construção, que denun­ciavam o autoritarismo das medidas do imperador.
Além disso, seu conteúdo contrariava os interesses de boa parte dos integrantes do Partido Brasileiro, bem como daqueles homens e mulhe­res que ainda resistiam à tentativa de incorporação de suas regiões ao Império do Brasil.
A balança de equilíbrio na Carta outorgada por D. Pedro I pendia para os poderes do Executivo, garantindo ao monarca um governo cen­tralizado, que lhe permitiria dar continuidade ao seu projeto imperial, como discutimos nas páginas anteriores.
Exemplo: Entre as principais características da Carta de 1824, podemos citar:
• A consagração do modelo de monarquia unitarista, na qual o imperador nomeia os presidentes de província, subordinando-os diretamente à autoridade central. Isso desagradou algumas regiões, pois foi interpretado como um desrespeito às autonomias locais;
• A instituição do padroado, segundo o qual a Igreja Católica no Brasil ficava subor­dinada à autoridade real;
• O sistema eleitoral indireto e censitário, que excluía uma grande parcela da popu­lação do direito ao voto e a divisão de poderes, não em três, como na teoria de Mon­tesquieu, mas em três mais um, que estaria acima desses três e que seria exercido exclusivamente pelo imperador: o Poder Moderador.
Vamos ler alguns trechos originais da Constituição de 1824, para melhor compreendermos os impactos gerados por ela em toda a socie­dade da época?
Segundo o documento outorgado por D. Pedro:
(...) o Império é a associação política de todos os cidadãos brasileiros; o seu governo é mo­nárquico, hereditário, constitucional e representativo; são cidadãos brasileiros: os que no Brasil tiverem nascido, quer sejam ingênuos ou libertos (...), todos os nascidos em Portugal e suas possessões, que sendo já residentes no Brasil na época em que se proclamou a independência (...), aderiram a esta.
Vejamos como a Constituição de 1824 define o poder moderador:
O poder moderador é a chave de toda a organização política, e é delegado privativamente ao imperador, (...) para que incessantemente vele sobre a manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos demais poderes políticos.




As insatisfações e reações à Constituição logo se fizeram sentir: em 1824, mesmo ano de sua outorga, explodiu um movimento contestatório em uma das regiões de maior ebulição do império.
Exemplo: Palco da Revolução Federalista de 1817 e alinhada aos portugueses durante a Revolução do Porto, Per­nambuco era um dos exemplos mais fortes de que o projeto de constituição de um novo império comanda­do a partir do Centro-Sul não seria facilmente implantado, pois a sua aplicação resultaria no sufocamento das identidades e das autonomias locais.
Por isso, em Pernambuco, onde a chama do autogoverno esteve acesa alguns anos an­tes, a notícia de que o rei nomearia um presidente de província para a região, desconside­rando a indicação da câmara municipal local, foi o estopim para o início do movimento nomeado de Confederação do Equador.
Entre as lideranças do movimento, que pretendia separar-se do Império do Brasil e for­mar um novo país composto por uma confederação de estados da qual fariam parte as pro­víncias da Bahia até o Grão-Pará, estavam o mestiço Natividade Saldanha e frei Joaquim do Amor Divino Rabelo e Caneca, mais conhecido como frei Caneca.
A outorga de uma Constituição vista como autoritária e o desrespeito à autonomia local reavivou os pendores federalistas da região, comprometendo o projeto unificador do im­perador D. Pedro I. A essa tentativa de secessão o imperador reagiu com firmeza, enviando tropas e militares que conseguiram derrotar os descontentes.
É importante ressaltar que também foi importante para a vitória das tropas enviadas pelo imperador o apoio dado a elas por um grupo formado por proprietários de terras e de escravos, e também pelos comerciantes portugueses, para quem as ideias de liberdade e de igualdade propagadas pelo grupo eram um sinal peri­goso, pois poderiam colocar em risco a “manutenção da ordem” em sua região.
A reação desencadeada a partir da capital do império, com o apoio de grupos locais, en­terrou novamente o sonho federalista acalentado nas províncias do Norte do império: frei Caneca, símbolo da resistência local, foi fuzilado, a mando do governo, em 1825.
A crise do Primeiro Reinado
A essa altura, você já deve ter percebido que a tarefa de governar e de, ao mesmo tempo, promover a unidade política do Brasil recém-inde­pendente não foi nada fácil para o imperador: acusado de autoritarismo pelo grupo que mais tarde seria conhecido como o dos liberais modera­dos, D. Pedro enfrentava ainda a oposição daqueles que lhe acusavam de privilegiar os interesses portugueses, concedendo a eles benefícios e vantagens das quais a população local não desfrutava.
Aliás, é sempre importante ressaltar que, nos primeiros anos após a emancipação política do Brasil, cresceu imensamente o sentimento antilusitano entre a população, ainda impactada pelas divergências que resultaram na separação entre os reinos do Brasil e de Portugal.
ATENÇÃO!!!
Isso não quer dizer que o antilusitanismo de parte da população significasse o fortalecimento do nacionalismo, do sentimento de pertença à nação brasileira.
Na verdade, o processo de constituição da identidade nacional bra­sileira teve início no período pós-independência e esteve em curso ao longo do século XIX, encontrando-se consolidado apenas em meados e fins desse século. A oposição aos portugueses ocorreu, em muitos casos, por causa do controle desse grupo sobre o comércio local em algumas regiões do Império, o que criava conflitos e ressentimento da população local em relação aos portugueses, sobretudo àqueles que não declara­ram apoio explícito à causa da independência.
Desse modo, as críticas à postura centralizadora e autoritária do Im­perador, somadas ao descontentamento causado pelos supostos privilé­gios concedidos por ele aos portugueses, em um momento de marcado sentimento antilusitano, contribuíram para fragilizar o governo de D. Pedro I, pois abalavam a sua popularidade.
Esse quadro foi agravado pelo envolvimento do imperador em dois conflitos bélicos: a guerra da Cisplatina e as disputas ligadas à sucessão do trono português.
Durante o período Joanino, a região da Cisplatina foi incorporada ao Reino do Brasil com o nome de Banda Oriental. Em 1825, teve início na região um movimento liderado por uruguaios desejando a separação do Império governado por D. Pedro I e a incorporação da região à Argentina.
O Brasil reagiu decretando guerra ao vizinho portenho, em um conflito que terminou três anos depois com a decretação da independência da região, que deu origem à Repúbli­ca Oriental do Uruguai, em 1828. O envolvimento do Brasil no conflito provocou inúmeras críticas ao imperador, em razão da sobrecarga de impostos cobrados pelo império para custear a participação do país nessa guerra.
A outra razão para o endividamento do governo brasileiro causava ainda mais revolta entre a população: com a morte de D. João VI, teve início em Portugal a disputa pelo trono português envolvendo a filha de D. Pedro, D. Maria da Glória, que era a sucessora legítima ao trono, e o irmão de D. Pedro, D. Miguel.
Disposto a intervir em favor da filha no conflito dinástico português, D. Pedro enviou re­cursos e mobilizou esforços para garantir a sua posse, contribuindo para acirrar ainda mais os ânimos no grupo dos brasileiros, cada vez mais insatisfeito com as ações do imperador.
Todos esses elementos reunidos potencializaram o clima de tensão e de oposição ao governo de D. Pedro I que, pressionado, reagiu de forma inesperada: abdicou ao trono do Império do Brasil em favor de seu filho mais velho, à época com cinco anos, e retornou ao continente europeu para disputar com o irmão o trono a que tinha direito hereditário. Em 1831, nove anos após o início de seu reinado no Brasil, D. Pedro retornava a Portugal, mas deixava o poder nas mãos de seu herdeiro, o futuro D. Pedro II.

O Segundo Reinado

D. Pedro II reina, mas não governa: o período regencial

Vejamos o que afirma o historiador José Murilo de Carvalho sobre o período da história do Brasil conhecido como Segundo Reinado, que vai do ano de 1831 até o ano de 1889.

Entre 1831 e 1889, o Brasil consolidou sua independência, garantiu a unidade da antiga colônia portu­guesa, definiu suas relações com os países vizinhos no rio da Prata, fundou uma monarquia constitucional representativa, manteve a liberdade de imprensa e a competição partidária, deu os primeiros passos na industrialização e, embora muito lentamente, livrou-se do trabalho escravo [...].

A afirmação acima já nos permite entrever alguns dos aspectos marcantes do período em que D. Pedro II governou o Brasil: em seu reinado, houve inúmeras rebeliões populares e elitistas, que puseram em risco o projeto de construção de um Brasil unificado, como so­nhara seu pai. Houve também nesses anos:
·         O acirramento das tensões entre o Brasil e a Inglaterra.
·         A consolidação do processo de construção da nação brasileira.
·         As disputas envolvendo liberais e conservadores pelo protagonismo na política nacional.
·         A decretação da proibição do tráfico de escravos.
·         O envolvimento do Brasil na Guerra do Paraguai.
A abdicação de D. Pedro I, reagindo às pressões vindas principalmente do grupo dos brasileiros, que deram origem aos chamados liberais moderados, pegou a todos de surpre­sa: mesmo os críticos mais impiedosos do imperador provavelmente não esperavam uma decisão tão drástica de sua parte.
Após um primeiro momento de surpresa e, em alguns casos, de festejos e hostilidades em relação aos portugueses, percebeu-se que a saída do imperador deixava o governo sem um comando. Isso porque, seu filho mais velho, o próximo na linha de sucessão, tinha na época apenas cinco anos. Diante desse quadro, o congresso reuniu-se para eleger uma re­gência trina que, como o nome sugere, seria composta de três governantes responsáveis pela condução política do país até que o imperador tivesse idade para assumir o comando do Império do Brasil.
Atenção!!!
Ressalte-se que a forma de governo do país permaneceu sendo uma monarquia, e que D. Pedro, àquela épo­ca apenas uma criança, já reinava, mas ainda não tinha condições de governar, sendo, portanto, necessária a organização de um governo regencial nesse ínterim.

RESUMO
No início deste capítulo, discutimos de forma muito cuidadosa como o rei D. Pedro I e o aristocrata José Bonifácio pretendiam, após o processo de independência, fazer do Brasil um Império constituído pelas mesmas regiões que no passado compunham a América Portuguesa.
Para que isso ocorresse, foi necessário o que o historiador Ilmar Rohloff de Mattos chamou de “expansão para dentro”, e que poderia ser traduzido na integração das demais regiões pertencentes ao antigo Império português ao novo país que se formava a partir do Centro-Sul do Brasil.
É bem verdade que essa integração nem sempre ocorreu de forma voluntária ou natural: algumas regiões demonstraram resistência à sua inclusão nesse novo Império, e foi necessário o uso da força para garantir que o projeto imperial de D. Pedro obtivesse êxito.
Vimos também que a política centralizadora do imperador, muitas vezes criticado pelo seu autoritarismo, esteve diretamente relacionada ao interesse na promoção de unidade política entre essas regiões distintas e distantes do Brasil pós-independência. Como é possível imaginar, passados apenas nove anos da for­malização da independência do Brasil, o projeto de nação assumido por D. Pedro ainda estava em curso: o que mantinha as regiões do império do Brasil unidas era, justamente, a força centrípeta que vinha do Rio de Janeiro, em decorrência da política centralizadora do imperador.
Ora, com a abdicação de Pedro I, como evitar o perigo de fragmentação do território brasileiro? Como sufo­car o desejo tão evidente em algumas regiões de maior autonomia local? Como garantir a “manutenção da ordem” na ausência de um governo forte? Essas são as questões que terão de ser enfrentadas pela elite senhorial que assumiu o controle político da nação após o retorno de D. Pedro a Portugal.
A ausência do rei possibilitará o crescimento do grupo político favorável a uma maior descentralização do poder e, com uma estrutura política mais descentralizada, o Império do Brasil tornou-se mais vulnerável às inúmeras revoltas que estouraram de Norte a Sul do país, algumas de caráter separatista, colocando a unidade do país em risco.
Por fim, o medo de que essas revoltas “levassem à anarquia”, ou seja, provocassem a dissolução do império e a alteração sua estrutura social, baseada na grande propriedade e na escravidão, levou os membros das elites, que se dividiam em liberais e conservadores e tinham divergências políticas, a chegarem a um acordo, em meados do século XIX, já no governo de Pedro II. Por essa razão, a alternância entre os gabinetes liberal e conservador e a semelhança na forma como ambos governavam será a prova de que chegara ao fim o período de disputas internas.
Em tais circunstâncias, o país entrava em uma nova fase, marcada pela estabilização po­lítica e pela consolidação do sentimento de pertencimento à nação brasileira. A identidade nacional já aparecia, fortalecida pelo surgimento de uma História pátria, de uma língua portuguesa distinta daquela falada na antiga metrópole, enriquecida pelos vocábulos de origem indígena e pela própria literatura romântica indianista, que exaltava as virtudes do índio, o símbolo legítimo da brasilidade.
Nesse mesmo processo, em que, na intenção de se constituir uma identidade nacional para o Brasil, a herança indígena foi ressaltada, e houve o apagamento da herança africana, pois em uma sociedade profundamente marcada pela escravidão, a cultura africana era vista como um elemento negativo, a ser descartado, consciente ou inconscientemente.
Entretanto antes de discutirmos melhor o Brasil de meados do século XIX, vamos analisar mais de perto o chamado Período Regencial?
Com a partida do rei de volta a Portugal (1831), tinha início no Brasil um momento de intensa instabilidade: de um lado, absolutistas, liberais moderados e exaltados discutiam e disputavam o controle político do país; de outro, manifestações explícitas de antilusita­nismo resultavam em cenas de violência e aumentavam o clima de tensão em toda a parte.
À medida que chegava a notícia da abdicação nas províncias mais distantes, aumenta­vam consideravelmente os conflitos vivenciados entre portugueses e a população local, e os ânimos daqueles que sempre defenderam mais autonomia regional se exaltavam.
Já nos primeiros anos de período regencial, houve inúmeras revoltas populares, deixan­do claro que o momento político vivido no Brasil daqueles anos era delicado.
Foi nesse contexto que o grupo dos liberais moderados, integrantes do Partido Brasilei­ro durante o Primeiro Reinado, ganhou maior destaque na política nacional, e conseguiu aprovar medidas que resultaram na descentralização do governo, garantindo maior auto­nomia às regiões e comprometendo a possibilidade de o governo central reagir com força às tantas revoltas que marcaram esse período.
A tabela ajuda a compreender melhor a composição partidária durante todo o perí­odo regencial.


Naquele contexto, o próprio clima era mais suscetível à vitória dos grupos favoráveis à descentralização, pois o tempo em que o imperador impunha uma política centralizadora ainda estava muito vivo na memória daqueles homens, que poucos anos antes faziam forte oposição ao que consideravam as medidas autoritárias do rei.
No entanto, a defesa de uma estrutura política mais descentralizada não significava que os liberais questionassem a ordem social em que viviam. Ao contrário, a manutenção da or­dem pública e o perigo da fragmentação do país estiveram entre as maiores preocupações do grupo. Assim, é nesse contexto que é criada, ainda em 1831, a Guarda Nacional.
Os comandantes da Guarda, chamados de Coronéis, eram, em muitos casos, aqueles que já possuíam o controle político de suas regiões, sendo a eles concedida maior autono­mia, ou seja, menor intervenção do governo central na resolução de conflitos locais.
Do ponto de vista do ambiente político provocado pela abdicação, o formato mais des­centralizado assumido pela guarda estava de acordo com as demais ações que marcaram a primeira fase do período regencial. Em 1834, houve nova vitória do grupo dos liberais moderados: três anos após o retorno de D. Pedro a Portugal, era aprovada uma reforma constitucional, a única em todo o Império que tornaria a estrutura política do país mais descentralizada.
Nas palavras de José Murilo de Carvalho:

“A Constituição foi reformada em 1834 por um Ato Adicional votado pela Câmara, que recebera para isso mandato especial dos eleitores. Foi a única reforma constitu­cional feita durante o Império. O Ato Adicional concedeu às províncias assembleias e orçamentos próprios e deu a seus presidentes poderes de nomeação e transfe­rência de funcionários públicos, mesmo quando pertencentes ao governo geral. O novo sistema só não era plenamente federal porque os presidentes (de província) continuavam a ser indicados pelo governo central”.

Além das medidas já relatadas, que garantiam às regiões mais auto­nomia em relação ao poder central, outro importante elemento que ga­rantia ao imperador o poder de controlar mais de perto as regiões e pro­víncias imperiais foi abolido pelo Ato Adicional: o Conselho de Estado.
O Conselho de Estado era formado por políticos indicados pelo próprio Impe­rador. Suas inúmeras atribuições pos­sibilitavam um controle mais efetivo do monarca sobre os mais variados aspec­tos de seu governo, contrariando os de­sejos de maior autonomia tão evidentes em algumas regiões.
Além disso, é importante lembrar que o próprio poder moderador, por ser de uso exclusivo do monarca, não vigorava durante o período regencial. Por todos esses motivos, o governo da regência teve como característica marcante o menor controle do poder central sobre as regiões integrantes do Império do Brasil e isso possibilitou o surgimento e o fortalecimento de inúmeras revoltas de Norte a Sul do país, como é possível observar na tabela.



As revoltas regenciais detalhadas na tabela anterior são as mais estu­dadas e divulgadas nos livros de História, mas não foram as únicas: hou­ve inúmeros casos de rebeliões, algumas de caráter separatista, outras desejando o federalismo e algumas até mesmo defendendo o retorno de D. Pedro, como foi o caso da revolta dos Cabanos, que, curiosamente, foi uma rebelião popular e conservadora.
Não houve unidade de interesses ou dos grupos sociais envolvidos nessas revoltas. Houve casos de movimentos protagonizados por escra­vos e libertos, como nos malês; houve rebeliões de caráter nitidamente popular, como a Balaiada, e houve também rebeliões de caráter elitista, como foi a Farroupilha.
Todas elas, no entanto, deixaram uma impressão clara aos homens da época: a descentralização política era perigosa, pois poderia levar à anarquia e até mesmo à fragmentação do território brasileiro.

O regresso conservador e a antecipação da maiori­dade de D. Pedro

“Fui liberal, então a liberdade era nova para o país, estava nas aspirações de todos, mas não nas leis, não nas ideias práticas; o poder era tudo, fui liberal. Hoje, porém, é diverso o aspecto da sociedade; os princípios democráticos tudo ganharam e muito comprometeram [...]”.
A afirmação acima é de Bernardo Pereira de Vasconcelos, membro da elite senhorial formado em Coimbra e deputado por Minas Gerais. Vasconcelos, apesar de ter pertencido ao grupo dos liberais, favoráveis à descentralização ocorrida após a abdicação de D. Pedro, afinal é de sua autoria o projeto de lei do Ato Adicional, agora se posicionava ao lado daque­les que ficarão conhecidos como os conservadores.
O sentimento de que a estrutura social brasileira, patriarcal e ancorada na escravidão, pudesse estar em risco uniu antigos opositores no desejo de reforma: mesmo Evaristo da Veiga, símbolo liberal, defendia ajustes no governo regencial para a garantia da ordem.
Atenção!!!
Assim, após a renúncia do regente Feijó e sua substituição pelo conservador Pedro de Araújo Lima, inicia­va-se o chamado regresso conservador, em que foram tomadas medidas visando à retomada do controle mais estreito do governo central sobre as regiões imperiais, evitando assim a possibilidade de fragmen­tação e de “anarquia”. Nesse sentido, em 1840, foi aprovada no parlamento a lei interpretativa do Ato Adicional, que diminuía os poderes dos presidentes de província.
Percebendo o ambiente favorável aos conservadores, e temendo a sua exclusão do jogo político imperial, os liberais reagiram de forma talvez inesperada: passaram a defender a antecipação da maioridade de D. Pedro, que completaria 18 anos em 1843. A alta popula­ridade do jovem imperador garantiu o sucesso da proposta e, em um clima de festas, foi aprovada pela assembleia geral, ainda em 1840, a maioridade do imperador que, em re­conhecimento pelo apoio a ele prestado, formou seu primeiro gabinete com políticos li­berais. Já no ano seguinte, no entanto, os conservadores retornavam ao poder, aprovando mais duas leis de caráter centralizador.
Em uma delas foi recriado o Conselho de Estado, garantindo ao rei a prerrogativa da nomeação do presidente do conselho e dos ministros que conduziriam a política nacional. Na outra, reformava-se o Código do Processo Criminal, garantindo o controle do Executivo sobre a po­lícia e o Judiciário. Rapidamente, o imperador, auxiliado pelo gabinete conservador que retornava à cena política, recolocava o país no rumo da centralização e da unidade, o que garantiria, a seu ver, a ordem e a estabilidade necessárias para o Império do Brasil.
Nesse processo, houve resistências: ao longo da década de 1840, ocorreram algumas reformas ligadas aos liberais, sendo a mais conheci­da delas a Revolta da Praieira, ocorrida na sempre resistente Pernambu­co. Em meados da década de 1850, entretanto, já não havia mais riscos sérios à unidade e estabilidade do país: seria o período áureo da chama­da conciliação.
Antes disso, porém, o imperador enfrentou um cenário de marcadas disputas entre liberais e conservadores. Utilizando-se das prerrogativas que lhe cabiam como decorrência do Poder Moderador, D. Pedro II pro­movia a alternância periódica no poder entre liberais e conservadores, dissolvendo a câmara sempre que necessário.
Dessa forma, o monarca pretendia fazer uma espécie de mediação ou de arbitramento entre os dois grupos e, assim, evitar a desestabiliza­ção política do império.
Resumo: Já afirmamos anteriormente que, apesar das divergências entre liberais e conserva­dores, os dois grupos não discordavam naquilo que era considerado o essencial: a manutenção de uma estrutura social estratificada, patriarcal e escravocrata.
Alguns historiadores atribuem essa relativa homogeneidade dos grupos à sua formação: entre liberais e conservadores era grande o nú­mero de bacharéis formados em Coimbra, que partilhavam valores co­muns e convicções semelhantes. Para outros, o temor de uma revolução social que alterasse a estrutura escravista e da propriedade da terra era o grande fator de unidade entre os dois grupos.
Seja pelo primeiro motivo, seja pelo segundo — ou mesmo por ambas as razões —, é certo que não havia tantas diferenças assim entre luzias, o apelido dos liberais, e Saquaremas, como ficaram conhecidos os conservadores.
Em 1848, D. Pedro II tomava mais uma medida visando à consolidação de uma estrutura política centralizada: naquele ano, foi criado o cargo de Presidente do Conselho de Ministros, a ser nomeado pelo imperador. No Brasil, D. Pedro II acumularia as funções de chefe de Estado e chefe de Go­verno, o que lhe garantia pleno controle sobre o processo político nacional.
Além disso, no caso brasileiro, o conselho de ministros escolhido pelo imperador convocava as eleições. O processo come­çava “de cima para baixo” ao contrário do caso inglês, em que o parlamento, for­mado por representantes do povo escolhidos por meio do voto, escolhe o Pri­meiro Ministro.
Na década de 1850, passados cerca de trinta anos do início da cons­trução do Brasil imperial, já era possível notar os seus resultados: o Bra­sil dos anos de 1850 era uma nação com relativa estabilidade, sem ris­cos aparentes de fragmentação e com a identidade nacional fortalecida por uma vigorosa produção artística e intelectual. Tínhamos, enfim, um país e uma nação.
Por esse motivo, o parlamentarismo implantado por D. Pedro II ficou conhecido como parlamentarismo às avessas.

LITERATURA ROMÂNTICA

O índio era exaltado como símbolo máximo da nacionalidade brasileira
HISTÓRIA ENSINADA NAS ESCOLAS

Destacava  a  trajetória  de  personagens heroicos que estimulavam o patriotismo e o orgulho nacional

A LÍNGUA PORTUGUESA

Incorporava vocábulos indígenas e adquiria características próprias, diferenciadas do português de Portugal

Nesse contexto, foi nomeado pelo imperador o gabinete conservador que foi considerado um dos símbolos da chamada hegemonia saqua­rema: formado por Eusébio de Queirós, Paulino José Soares de Sousa e Joaquim José Rodrigues Torres, este foi o segundo gabinete mais longo do Segundo Reinado. Nessa gestão, foram tomadas algumas medidas de suma importância para o Brasil daquele momento: a abolição do tráfico de escravos e a aprovação da lei de terras.
A esta altura, você deve estar se perguntando como um gabinete conservador foi o responsável pela apro­vação da lei que proibia o tráfico de escravos, se os conservadores representavam justamente a elite se­nhorial, proprietária de terras e resistente a quaisquer mudanças que pudessem pôr em risco seu estatuto e seus privilégios. A resposta a essa pergunta começa na análise das relações entre o Brasil e a Inglaterra.
No Brasil do pós-independência, restaram muitas heranças da longa presença portu­guesa nas Américas.
Exemplo:

A LÍNGUA FALADA
A DINASTIA REINANTE
AS COMIDAS TÍPICAS
OS HÁBITOS E COSTUMES

A ORGANIZAÇÃO SOCIOESPACIAL
A RELIGIOSIDADE

Muitos outros exemplos poderiam ser citados. Parte do legado deixado pelos portugueses, sem dúvida, foi a relação de dependência econômica do Império do Brasil com a Inglaterra.
A condição para que Portugal reconhe­cesse a independência do Brasil foi o pa­gamento de uma dívida que, na prática, significou a transferência de todo o débito português com a Inglaterra para o Brasil. A partir de então, o governo brasileiro pas­saria a sofrer com as constantes pressões inglesas pela proibição do comércio de es­cravos no país.
Em 1826, como condição para o reconhecimento inglês da independência do Brasil, foi assinado um tratado que entraria em vigor em 1831, segundo o qual estaria proibido o trá­fico de cativos no país. Cinco anos mais tarde, quando o tratado assinado com os ingleses passaria a valer, o país foi palco de importantes mudanças políticas.
Isso porque, com a abdicação de D. Pedro I, o grupo dos liberais moderados, formado principalmente por senhores de terras e escravos, assumiu o controle político do país.
Assim, é possível que a lei, em vigor desde 1831, que proibia o tráfico de escravos, não tenha sido cumprida porque contrariava diretamente os interesses do grupo que controlava politicamente o país naqueles anos.
Outro motivo para o não cumprimento da lei foi a estrutura descen­tralizada que assumiu o país nos anos da regência, pois ela dificultava o controle mais estreito do governo central sobre as províncias do império.
O fim do comércio de escravos no Brasil traria prejuízos econômicos justamente para o grupo em evidência com a saída do imperador.
ATENÇÃO!!!
O fato é que, de 1831 a 1850, ao contrário do que determinava a lei, o tráfico de escravos para o Brasil aumentou ao invés de diminuir. Na década de 1830, o café já se tornara o principal produto de exportação da economia brasileira, e a expansão da lavoura cafeeira no Sudeste do país aumentava a demanda por mão de obra escrava.

A LEI EUSÉBIO DE QUEIRÓS

À Inglaterra, por sua vez, não passou despercebido o fato de que o tratado assinado pelo Brasil era descumprido: já na década de 1840, au­mentaram significativamente as pressões vindas daquele país, ao ponto de ter sido aprovada em solo britânico uma lei que considerava pirataria os navios que transportassem escravos rumo ao Brasil, e ainda permitia à marinha inglesa a interceptação de tais embarcações.
A invasão das águas territoriais brasileiras pelos navios ingleses con­figurava uma evidente violação à soberania nacional, e o governo brasi­leiro pouco podia fazer para reagir às afrontas do governo inglês, pois não possuía força militar ou econômica à altura do país europeu.
Assim, quando os conservadores assumiram o governo, em 1848, uma questão se colocava para eles: como assumir uma posição em re­lação ao tráfico de escravos que não demonstrasse fraqueza diante das agressões inglesas? Percebendo o aumento das tensões entre o Brasil e a Inglaterra e cientes da impossibilidade de o Brasil reagir às pressões bri­tânicas, os políticos da chamada trindade saquarema decidiram tomar para si a tarefa de extinguir o tráfico.
Em 1850, aprovaram a Lei Eusébio de Queirós (Decretava a proibição do tráfico de es­cravos em todo o território nacional). Dessa vez, o governo fiscalizaria de perto o cumprimento da lei e, cinco anos após a sua de­cretação, não aportavam mais navios trazendo escravos no Brasil. A lei, dessa vez, fora cumprida à risca. No mesmo ano, outra lei muito impac­tante foi aprovada: a Lei de Terras.
Alguns historiadores têm relacionado as duas leis em suas análises. Tendo sido publicadas no mesmo ano, elas expressam a preocupação da elite senhorial com relação à disponibilidade de mão de obra para a lavoura no curso de alguns anos, quando, fatalmente, a escravidão já teria sido extinta. Isso porque, com o término do tráfico de escravos, a existência da escravidão no país estava com os dias contados.

Lei de Terras
A partir da aprovação da Lei de Terras, a terra tornava-se mercadoria no país, passando a ser adquirida por meio da compra, e não mais por meio de doa­ções, como havia sido o costume em todo o período da colonização portu­guesa e nos primeiros anos do Império.
É importante ressaltar que o gabinete que aprovou e fez cumprir a Lei Eusébio de Queirós era conservador, e, portanto, estava afinado com os interesses da elite pro­prietária de terras e de escravos, mais que interessada na manutenção da escravidão.
Na impossibilidade de adiar e resistir às pressões inglesas pelo fim da escravidão aprovou-se a lei proibindo o tráfico de cativos para o Brasil, mas, ao mesmo tempo, com a Lei de Terras, garantia-se a disponibilida­de de mão de obra para a lavoura no futuro pós-es­cravidão, pois a transfor­mação da terra em mer­cadoria dificultaria, ou até impediria, o acesso de ex-escravos a ela como pe­quenos proprietários.
Do ponto de vista político, os anos de 1850 e 1860 foram anos de es­tabilidade e de alternância no poder entre liberais e conservadores. As disputas entre os dois grupos, que marcaram as primeiras décadas do Segundo Reinado, haviam cedido lugar a um entendimento tácito de que ambos teriam o seu lugar, ainda que separadamente, no governo de D. Pedro II.
Essa estabilidade é rompida com o início da guerra mais longa e san­grenta da História do Brasil: a Guerra do Paraguai.
Como veremos, a abolição da escravidão significou a libertação, mas não a inclusão social da imensa população escrava do Brasil oitocentista.

Guerra do Paraguai
Motivada por disputas geopolíticas en­tre os países da região da bacia do Pra­ta, Brasil, Paraguai, Uruguai e Argentina, a participação do Brasil na Guerra do Paraguai, pela sua duração, pela quanti­dade de perdas humanas e de prejuízos econômicos, além dos impactos sociais dela resultantes, foi de fundamental im­portância para a derrocada do governo de D. Pedro II.
Entre os impactos provocados pela Guerra do Paraguai na socieda­de brasileira, podemos citar: o fortalecimento do sentimento de iden­tidade nacional, motivado pela reação nacionalista da população aos ataques do Paraguai ao Brasil e também pelo fato de, pela primeira vez, brasileiros de regiões distantes conviverem e compartilharem o mesmo cotidiano de luta contra o inimigo estrangeiro.
Isso possibilitou a criação de vínculos concretos entre brasileiros de todas as regiões do país, contribuindo para solidificar o sentimento na­cionalista em toda a pátria.
Outras consequências da guerra foram a perda de popularidade do imperador, o crescimento de um sentimento corpo­rativo dentro do exército e também o crescimento do movimento abolicio­nista, que aumentaria as pressões pelo fim da escravidão. Aliás, esse seria um tema que teria um impacto significativo na ruptura entre o imperador e um dos grupos so­ciais que mais lhe deu apoio em todo o seu governo: a elite senhorial e proprietária de escravos.
A partir da década de 1870, as fissuras na relação da monarquia com a Igreja, com o exército e com a classe de proprietários de escravos serão mais uma evidência de que o governo monárquico entrava em crise no país.

Crise e fim do Império do Brasil (1870-1889)

Como já adiantamos, o fim do Império não foi decorrência, unicamente, de um golpe militar: a Proclamação da República resultou de um longo processo de desgaste do Império, acentuado em seus últimos vinte anos.
De um lado, o Estado imperial brasileiro foi se incompatibilizando com sucessivos segmentos da sociedade que compunham suas bases de susten­tação: Igreja, militares, classe senhorial (a questão religiosa, a questão mili­tar, a abolição da escravidão). De outro lado, as profundas transformações ocorridas nas décadas de 1870 e 1880 levaram a um descompasso entre o poder político e o poder econômico na sociedade imperial.
A partir da década de 1870, ocorreu a ascensão de novos grupos sociais (cafeicultores paulistas, classes médias urbanas), que vão reclamar de sua falta de representatividade política no governo imperial, e vão alterar a tradicional composição de forças que caracteri­zava essa sociedade. É importante lembrar que a classe tradicionalmente vinculada ao poder político no império era a elite senhorial, da qual fa­ziam parte, principalmente, os cafeicultores do vale do Paraíba.
Esses estavam majoritariamente concentrados no Partido Conserva­dor. O Partido Liberal também era, na maior parte, formado por proprie­tários rurais, mas de menor porte e voltados para o mercado interno.
Menos de vinte anos após o fim da guerra do Paraguai, a monarquia chegaria ao fim no Brasil.
A classe formada pelos cafeicultores de São Paulo, que no fim do im­pério já lideravam a produção de café em âmbito nacional, não estava representada nos dois mais tradicionais partidos políticos do império, e por isso não tinha poder político à altura de sua importância econô­mica para o país. De São Paulo, portanto, principalmente de um partido formado em 1870, o Partido Republicano Paulista, surgiu uma forte e organizada oposição ao governo de D. Pedro II.
Todos esses fatores, reunidos, ajudam a compreender o que ficou conhe­cido como um processo de crise de legitimidade da monarquia, que pode ser explicada pela incapacidade do Estado imperial de articular as velhas e as no­vas demandas surgidas a partir da ascensão desses novos grupos.
À perda de apoio dos cafeicultores do vale da Paraíba (chamados de “Os republicanos do 14 de Maio”, um dia após a decretação da Lei Áurea, que aboliu da escravidão no Brasil), somada aos desgastes do governo com a Igreja e o exército não se seguiu a formação de uma nova base de sustentação para o imperador: ele perdia apoio das classes que tradicionalmente lhe deram suporte, sem substituí-los por novos grupos de apoio.
A reunião de grupos descontentes com a monarquia, como uma parcela dos militares, da elite paulista e da própria elite senhorial escravista possi­bilitou a organização de um golpe que pôs fim à monarquia no Brasil.
No entanto, em relação à Proclamação da República, é importante ressaltar a falta de participação popular efetiva nesse processo.
Aristides Lobo, jornalista e futuro ministro do governo republicano, que foi testemunha ocular do dia 15 de novembro, deixou um depoimento marcante sobre esse dia. Na visão do jornalista, o povo assistiu “a tudo bestializado, atônito, sem conhecer o que significava”.
Desse modo, mais como o resultado de um longo processo de desgaste do que pela for­ça das ideias republicanas, chegava ao fim no Brasil, quase setenta anos depois, o governo monárquico da dinastia dos Bragança. A partir de 1889, teria início do Brasil o longo, tur­bulento e descontínuo período republicano.


RESUMO DO CAPÍTULO

·                    Nos quase 80 anos de existência do Império do Brasil, muitas coisas aconteceram, a maior parte delas não tão naturais quanto se pensa: a unidade do território brasileiro foi resultado de um processo e, ao mesmo tempo, de um projeto: o de construção do Império do Brasil, a partir do território que um dia pertenceu aos portugueses.
                    Esse processo/projeto teve início com D. Pedro I e foi implantado por meio de uma po­lítica vista como autoritária e centralizadora. Em meados do século XIX, estava consolidada a unidade e o modelo político monárquico-centralizador, assim como a nacionalidade bra­sileira, também resultado de um processo.
                    Nas relações internacionais, o país teve de lidar com as pressões inglesas pelo fim do tráfico de escravos, que finalmente foi proibido em 1850. Alguns anos depois, o país se en­volveria em um conflito de grandes proporções: a Guerra do Paraguai. As consequências do conflito e a nova composição social do país estiveram diretamente ligadas à crise que pôs fim ao Império no Brasil.

ATIVIDADE DO CAPÍTULO III (ENVOLVE AS QUESTÕES 3, 4 E 5)

Questão 1 Acerca da Independência do Brasil, é correto afirmar que:
A) Consubstanciou os ideais propostos pela Insurreição de 1817.
B) Instituiu a monarquia como forma de governo, a partir de um amplo movimento popular.
C) Implicou na adoção da forma monárquica de governo e preservou os interesses básicos dos proprietá­rios de terras e de escravos.
D) Propôs, a partir das ideias liberais das elites políticas, a extinção do tráfico de escravos.
E) Provocou, a partir da Constituição de 1824, profundas transformações nas estruturas econômicas e sociais do país.

Questão 2 A abdicação do Imperador D. Pedro I representou a culminância dos diferentes problemas que caracte­rizam o Primeiro Reinado, a exemplo do (a):
A) Apoio inglês à política platina do Império.
B) Apoio das províncias à política do Reino Unido implantada por D. Pedro I, após a morte de D. João VI.
C) Conflito entre os interesses dos produtores tradicionais de açúcar e os novos produtores de ouro.
D) Confronto entre os grupos políticos liberais e o governo centralizado e com tendências absolutistas de D. Pedro I
E) Crescente participação popular nas manifestações políticas, favorecidas pela abolição do tráfico.

Questão 3 A organização do Estado Brasileiro que se seguiu à independência resultou do projeto do grupo:
A) Liberal-conservador, que defendia a monarquia constitucional, a integridade territorial e o regime cen­tralizado
B) Maçônico, que pregava a autonomia provincial, o fortalecimento do executivo e a extinção da escravidão.
C) Liberal-radical, que defendia a convocação de uma Assembleia Constituinte, a igualdade de direitos políticos e a manutenção da estrutura social.
D) Cortesão que defendia os interesses recolonizadores, as tradições monárquicas e o liberalismo econô­mico.
E) Liberal-democrático, que defendia a soberania popular, o federalismo e a legitimidade monárquica.

Questão 4 Como elemento comum à maioria das rebeliões que marcaram o período regencial (1831-1840), des­taca-se:
A) A oposição ao regime monárquico.
B) A defesa do regime republicano.
C) O repúdio à escravidão.
D) As críticas e a insatisfação em relação ao poder centralizado.
E) O boicote ao voto censitário.

Questão 5 A consolidação do Império nas duas primeiras décadas do Segundo Reinado está ligada à(ao):
A) Afirmação do projeto autonomista liberal, pondo fim às Rebeliões Provinciais.
B) Recuperação das lavouras tradicionais, como açúcar, eliminando-se a hegemonia do setor cafeeiro.
C) Conciliação entre liberais e conservadores, para conter o crescente movimento republicano.
D) Hegemonia do projeto político conservador, centralizado e que projetava a Coroa sobre os Partidos.
E) Encaminhamento da abolição, garantindo-se a mão de obra à lavoura através da imigração.


CAPÍTULO IV
Ordem Unida: sentido! República Militar
A República Militar
O Governo Provisório
O Código Penal de 1890
O novo governo de Deodoro da Fonseca
De fevereiro de 1891 a novembro de 1891
O governo do Marechal Floriano Peixoto
A Primeira Constituição Republicana
(ATENÇÃO: NÃO HÁ INDICAÇÃO DESSA MATÉRIA PARA A AV2, MAS É TEMA DO CASO CONCRETO 7 – REPÚBLICA VELHA, A CONSOLIDAÇÃO, POR ISSO DEIXO AQUI PARA CONSULTA PELOS COLEGAS)


CASO CONCRETO 7

Em um curto espaço de tempo o País experimentou mudanças muito importantes: primeiro, com a abolição da escravatura ainda no império e, logo, após, a Proclamação da República. Diante de fatos históricos de tanta relevância, as elites políticas e econômicas do período viram a necessidade de buscar a reorganização das estruturas jurídicas do país, levando em consideração as novas realidades política, social e econômica que se apresentavam.

a) analisando algumas características da Constituição de 1891, tais como: Unidade Federativa, Sistema Presidencialista, divisão de poderes, separação entre Estado/Igreja Católica e casamento civil, é possível correlacionar estas posições assumidas pelo Estado brasileiro com o modelo de organização política adotado pelos Estados Unidos?

b) o regime do Padroado foi mantido pela Constituição de 1891? Justifique.

c) que razões teriam levado o governo republicano a produzir o Código Penal mesmo antes de organizar o Estado republicano por meio de uma constituição?

Respostas:


a) Sim. A Constituição de 1891 batizou o País como a República dos Estados Unidos do Brasil, tornando explícito figurino norte-americano que modelou o seu  conteúdo. Inspirados neste modelo, nossa primeira Constituição, pós-império, adotou a República Federativa como sistema institucional, liderado por um regime político presidencialista, onde a população passa a escolher os representantes dos municípios, estados e da federação por meio do voto direto. Os Estados da Federação passaram a ter grande autonomia, podendo empreender medidas próprias nos setores jurídico, fiscal e administrativo. Paralelamente, observamos a separação oficial entre o Estado e a Igreja.

b) Não. A partir da proclamação da República e promulgação da Constituição de 1891, houve a rejeição de qualquer união entre o poder civil e o poder religioso, colocando um fim ao Regime do Padroado e instaurando-se um novo regime, o da separação Igreja/Estado. Desta forma, caberia ao Estado garantir a liberdade e a igualdade de todos os cidadãos, independente dos valores morais e religiosos, garantindo a secularização do casamento, do registro civil, dos cemitérios, o término da educação pública confessional.

c) Até à abolição da escravatura, quase a totalidade da força de trabalho rural e também boa parte da urbana era negra; presume-se, então, que o contingente de ex-escravos livres e que foram às cidades em busca de trabalho, tenha contribuído vertiginosamente para o crescimento populacional urbano, o que deve ter assustado e muito as minorias dominantes. A criação de uma norma repressora seria alternativa em curto prazo para controlar e disciplinar este novo contingente de negros nas cidades.


CAPÍTULO V
Café ou leite?
O Café com leite: a política na República Oligárquica
Movimentos Sociais
Movimentos rurais
As revoltas urbanas
Economia cafeeira e primeiras indústrias
O Código Civil de 1916
O movimento operário
A Semana de Arte Moderna
O Tenentismo
A crise da Oligarquia
(ATENÇÃO: NÃO HÁ INDICAÇÃO DESSA MATÉRIA PARA A AV2, MAS É TEMA DO CASO CONCRETO 8 – REPÚBLICA VELHA, POR ISSO DEIXO AQUI PARA CONSULTA PELOS COLEGAS)


CASO CONCRETO 8

a) o que é o voto de cabresto e curral eleitoral?
R.: Voto de cabresto é quando o cidadão é obrigado a votar em alguém e curral eleitoral é o reduto eleitoral do candidato.

b) por que razão a adoção do voto universal na CF/1891 não possibilitou a eleição de autênticos representantes da vontade popular?
R.: porque o voto não contemplava toda a população, proibindo mulheres e analfabetos de votar e pelas fraudes.

c) é possível afirmar que o chamado voto de cabresto ainda seja utilizado em pleno séc. XXI?
R.: sim, hoje em dia há muitas trocas de favores por votos, a pessoa não chega a ser obrigada a votar, mas é "comprada".



CAPÍTULO VI
Terra em transe - A Era Vargas
“Façamos a revolução antes que o povo a faça”
Os anos 1920: permanências, tensões e expectativas
Da vitória do candidato oficial ao movimento revolucionário
O período do Governo Provisório - de 1930 a 1934
O período do Governo Constitucional de 1934 a 1937
O período da Ditadura do Estado Novo (de 1937 a 1945) e a Constituição de 1937
A questão federativa e o Estado Novo
O Departamento de Imprensa e Propaganda e a nova
institucionalidade social e trabalhista do Estado brasileiro
Vargas, o “protetor dos trabalhadores”, o “pai dos pobres”
Da continuidade da configuração da institucionalidade social e
trabalhista no Estado Novo, iniciada no período do Governo Provisório
O enfraquecimento e a derrocada do Estado Novo
Uma digressão importante - o papel do exército no período de 1930 a 1945
(ATENÇÃO: NÃO HÁ INDICAÇÃO DESSA MATÉRIA PARA A AV2, MAS É TEMA DO CASO CONCRETO 9 – ERA VARGAS, GOVERNO PROVISÓRIO E CONSTITUCIONAL, POR ISSO DEIXO AQUI PARA CONSULTA PELOS COLEGAS)
  

CASO CONCRETO 09

 a) Que acontecimentos (internos e externos) são determinantes para que a Carta de 1934 reconhecesse direitos sociais como direitos de índole constitucional?
 Internamente: República Velha, desgaste da política dos latifúndios e fraudes eleitorais, surgimento da classe médica, aparecimento dos sindicatos, processo de industrialização, insatisfação dos militares.
Externamente: Ideologias socialistas e anarquistas que solicitam melhor distribuição da riqueza, sindicalização do trabalho, quebra da bolsa em Nova York em 1929 e o surgimento do chamado estado social (a partir da crise o Estado passa a ser um mediador do lucro, a burguesia apoia o Estado).

b) Quem está autorizado a votar, segundo a Constituição de 1934? O voto feminino era obrigatório ou facultativo, segundo a Constituição de 1934?
 R: O código permitia apenas que mulheres casadas com autorização do marido, viúvas e solteiras com renda pudessem votar. Tais restrições só foram eliminadas no Código Eleitoral de 1934. No entanto, o código tornou apenas o voto masculino obrigatório. Com a promulgação da Constituição de 1934, foram eliminadas todas as restrições, porém, manteve-se o voto facultativo da mulher, o que passou a ser obrigatório somente em 1946.


CAPÍTULO VII
A entrada é uma rua antiga estreita e torta: da Democracia à Ditadura
A Constituição Democrática de 1946
Principais características da Constituição de 1946
O Segundo Governo de Getúlio Vargas
O industrialismo de JK
O curto governo Jânio Quadros
João Goulart e o golpe militar de 1964
(ATENÇÃO: NÃO HÁ INDICAÇÃO DESSA MATÉRIA PARA A AV2, MAS É TEMA DO CASO CONCRETO 10 – ERA VARGAS, O ESTADO NOVO E A DITADURA VARGAS, POR ISSO DEIXO AQUI PARA CONSULTA PELOS COLEGAS)
  

CASO CONCRETO 10 

a) Por que razão o Parlamento não se utilizou das prerrogativas que a Constituição lhe conferia?
b) É possível conceber um regime democrático com a concentração das funções legislativa, executiva e judiciária nas mãos do Chefe do Poder Executivo?
c) O Estado Novo de Vargas é um caso isolado no período ou pode teer recebido influências externas na forma como se configurou?

Respostas:
a) o parlamento permaneceu fechado durante todo o Estado Novo.
b) não, deve haver equilíbrio entre os poderes, um controlando o outro.
c) não, havia o comunismo, o nazismo e os regimes fascistas.


CAPÍTULO VIII
Olhos grandes sobre mim - Da ditadura à abertura lenta e gradual
As primeiras alterações na Constituição, Resistência e Repressão
O Ato Institucional n°5
Quando a exceção vira regra. Uma década de arbítrio sem freio
Médici comemora com a taça
A repressão política – Os “Anos de Chumbo”
A abertura lenta e gradual
Eu organizo o movimento - O processo de redemocratização do Brasil
(ATENÇÃO: NÃO HÁ INDICAÇÃO DESSA MATÉRIA PARA A AV2, MAS É TEMA DO CASO CONCRETO 12 – O GOLPE MILITAR DE 1964 E A INSTALAÇÃO DO REGIME AUTORITÁRIO, POR ISSO DEIXO AQUI PARA CONSULTA PELOS COLEGAS)

CASO CONCRETO 12
Para esta décima segunda aula você deverá solicitar aos alunos que leiam, previamente, os conteúdos da página 170 (a partir de “João Goulart e o golpe militar de 1964”), situado no Capítulo 7 até o fim da página 184, situada no Capítulo 8. Essa aula é de grande importância, pois se vincula a uma experiência negativa recente da história brasileira. Como se pode observar, vários foram os instrumentos normativos utilizados para se tentar legitimar a ditadura militar (ou civil-militar, como alguns entendem) como um evento necessário e inafastável para preservação da ordem. Assim, é necessária especial atenção a alguns destes instrumentos e, principalmente, ao modus procedendi utilizados pelo regime militar-ditatorial que serviram para vilipendiar as liberdades (públicas e privadas). O professor pode trazer á baila assuntos corriqueiros que vêm sendo noticiados de forma veemente pela mídia acerca de movimentos como o “Tortura Nunca Mais”, ou as investigações encaminhadas pela “Comissão da Verdade”. A experiência docente vem demonstrando que não é incomum encontrar alunos que, não tendo vivenciado a experiência do período da ditatorial, demonstram pouca preocupação com o fortalecimento de uma ordem democrática que assegure ampla participação política e garanta os direitos fundamentais. Mais preocupante ainda quando esses alunos frequentam o Curso de Direito, sendo corresponsáveis pela manutenção da ordem democrática. Nessa linha, na condição de educadores, é nossa função aclarar sobre os benefícios do uso da autonomia, seja ela pública, seja ela privada, bem como alertar para os perigos dos discursos autoritários e violentos. São marcos jurídicos fundamentais do período: os atos institucionais 01, 02, 03, 04 e 05, a Constituição de 1967, a Emenda Constitucional nº 1 à constituição de 1967 (ou Constituição de 1969). Por esta razão deverão ser apresentados no decorrer das aulas. São marcos jurídicos que embora sem a importância dos acima indicados, ajudam no processo de exemplificação dos fatos narrados no decorrer da aula os que seguem: Atos Institucionais nº 13 e 14 de 05 de setembro de 1969, a Lei de Segurança Nacional de 1969, o Estatuto dos Partidos de 15 de junho de 1965 (Lei n° 4.740/65), o Ato Complementar no 4 de 20 de novembro de 1965, que estabelece normas para a criação de partidos políticos.

Respostas:
a) sim, há uma crítica escondida dentro da notícia do tempo.
b) representa um outro golpe.
c) não, porque um Estado democrático deve garantir os direitos e deveres e não suprimi-los.


CAPÍTULO IX
O retorno paulatino à normalidade democrática
A Era Tancredo... Quer dizer, a Era Sarney
As graduais reconquistas nos campos da política e das liberdades públicas
A economia na Era Sarney — o elo fraco da corrente
A Constituinte e o exercício da cidadania
Constituinte: vamos à esquerda ou vamos à direita?
As críticas dos setores conservadores e a reação progressista
A Constituição de 1988, a conquista da “Constituição Cidadã”
O Texto Magno e as novas conquistas
(ATENÇÃO: NÃO HÁ INDICAÇÃO DESSA MATÉRIA PARA A AV2, MAS É TEMA DOS CASOS CONCRETOS 13 – DA DISTENSÃO LENTA E GRADUAL DO REGIME AUTORITÁRIO AO PROCESSO DE REDEMOCRATIZAÇÃO E 14 – OS NOVOS TEMPOS SOB A LUZ DA CONSTITUIÇÃO DE 1988, POR ISSO DEIXO AQUI PARA CONSULTA PELOS COLEGAS)


CASO CONCRETO 13

Há quem afirme, aliás, que uma das sínteses mais exatas da luta ideológica que se fez notar no processo constituinte que originou a Constituição de 1988 pode ser observada no inciso IV do artigo 1º da referida Carta. Este dispositivo afirma que “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos (...) IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;(...)”.

Neste sentido, pergunta-se:

a) Por que este dispositivo revela um embate ideológico?

b) Que visão restou privilegiada na norma constitucional: a posição mais à direita, (defendida pelo Centrão), ou a posição mais à esquerda (defendida pelos grupos autodenominados progressistas)?

Respostas:

a) porque a social-democracia acredita no trabalho que vai dignificar o homem. A livre iniciativa é uma das propostas do neoliberalismo.

b) com certeza a visão mais à direita, mais conservadora. A grande parte do legislativo foi eleita pelos militares e não tem como os militares definirem algo voltado para a esquerda.


CASO CONCRETO 14

Como nós estudamos no Capítulo 8 do nosso Livro Didático, as manifestações populares foram absolutamente vedadas pelo regime militar de 1964, por intermédio de vários instrumentos jurídicos e pelo uso violento de medidas de força. Uma geração de jovens brasileiros não teve a oportunidade de participar ativamente da vida política do país, sendo, inclusive vedada qualquer manifestação política que se opusesse aos interesses da cúpula militar no poder. Já sob a vigência da Constituição Cidadã, um acontecimento de especial relevo deu-se, então, no ano de 1992, tendo sido denominado "o movimento dos caras pintadas", quase 24 anos após o arbitrário AI-5. Esse fato político teria, inclusive, grande peso no processo de impeachment do Presidente Collor. Neste sentido, responda:

a) O que foi o movimento dos "Caras Pintadas" e o que representou no período?

b) Lembra da frase "tradição que se renova", no exercício da Aula 12? Pois é... Pode o processo de impeachment do Presidente Collor ser considerado como um outro golpe de Estado? Qual a diferença entre o afastamento do Presidente Collor, em 1992, e o afastamento do Presidente João Goulart, em 1964?

Respostas:

a) Os caras-pintadas foi o nome pelo qual ficou conhecido o movimento estudantil brasileiro realizado no decorrer do ano de 1992 que teve, como objetivo principal, o impeachment do presidente do Brasil na época, Fernando Collor de Mello. O movimento baseou-se nas denúncias de corrupção que pesaram contra o presidente e, ainda, em suas medidas econômicas impopulares, e contou com a adesão de milhares de jovens em todo o país. O nome "caras-pintadas" referiu-se à principal forma de expressão e símbolo do movimento: as cores verde e amarelo pintadas no rosto dos manifestantes.

b) Jango - sim, porque o presidente foi retirado de seu posto de forma ilegal, com os militares assumindo o governo em seguida. Collor - não, porque as denúncias de corrupção, a perda de apoio no Congresso e as manifestações das ruas tornaram o governo insustentável.


CAPÍTULO X
A CAMINHO DO FUTURO: O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
(ATENÇÃO: NÃO HÁ INDICAÇÃO DESSA MATÉRIA PARA A AV2, MAS É TEMA DO CASO CONCRETO 15 – A CONTEMPORANEIDADE E A CONSTRUÇÃO DE UMA TRADIÇÃO JURÍDICA, POR ISSO DEIXO AQUI PARA CONSULTA PELOS COLEGAS)

CASO CONCRETO 15

Como tivemos a oportunidade de analisar, a história do Brasil é repleta de permanências e rupturas. O direito não deixa de ser um instrumento de solidificação de algumas permanências (já que o direito também tem por função conceder estabilidade social), mas também pode ser visto como agente de transformação (introduzindo normas que aceleram o processo de mudanças sociais e mentais no seio social). Neste sentido:
a) O caso do "mensalão" pode ser considerado um fato isolado em nossa história ou representa uma permanência indesejável de nossa cultura política?
b) O reconhecimento da união estável entre pessoas do mesmo sexo pode ser explicado pela tradição jurídica e mental do povo brasileiro ou representa uma ruptura com um tipo de mentalidade vigente em nosso país cuja superação foi acelerada pelo Direito?
Respostas:
a) representa uma permanência indesejável na nossa cultura política.
b) é uma ruptura pontual, tendo em vista que a sociedade ainda é conversadora.

.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.